Estamos entre Sines e Porto Covo e já vimos a costa transformar-se, passando de grandes areais abertos para pequenas e grandes baías encerradas em falésias; as rochas são omnipresentes e também as chaminés brancas e vermelhas da central termoeléctrica de Sines. Nem Pascal e Pascale – assim mesmo, “les Pascaux”, brincam – lhes escapam. Encontramo-los por acaso. Já passámos a praia da Casca Branca (conhecida por Vieirinha) e a da Oliveirinha, unidas por um areal imenso na baixa-mar, povoado de lagoas e alguns recantos rochosos. O casal de Nancy está no final de um carreiro poeirento: apenas a autocaravana com vista para o mar povoado de rochas. Há um areal pequeníssimo, revelam, descendo pela falésia à direita. Um cantinho do paraíso, dizem de sorriso aberto. A única mácula é a silhueta das chaminés de Sines: “Mas olhamos para ali”, diz Pascal, rindo e apontando para Sudoeste, água azul intensa e recortes rochosos indisciplinados.
É para Sul que percorremos a falésia, de carro, para darmos de cara com a Samoqueira, uma das mais emblemáticas praias alentejanas. Já foi segredo, quase deserta. No fundo da longa escadaria com cordas azuis e brancas como corrimão, o areal distribui-se por recantos recortados nas arribas; do alto cai uma queda de água, o mar atravessa rochas e desfaz-se em lagoas de várias cores.
Seguimos a caminho de Porto Covo: a praia do Serro de Água, outra baía rochosa com escada de acesso, tem ao lado uma outra, falésia coberta de vegetação e areal deserto; um promontório anuncia a praia do Salto e depois a baía alarga; a praia Grande justifica o nome e já estamos às portas de Porto Covo, de cujo pitoresco porto, no fundo de uma garganta, partem os barcos para a Ilha do Pessegueiro. A mirá-la, alguns quilómetros à frente, a praia da Ilha, há muito “descoberta”.
O oposto da praia dos Aivados, desvio antes de uma paragem de camionetas. No Café Canaviais confirmam-nos o caminho. Cinco minutos de solavancos e estacionamos. A linha de água é quase aqui, seixos lisos, grandes, separam-nos de uma pequeníssima língua de areia – que desaparece à direita, até passarmos umas arribas amarelo-laranja onde cegonhas fazem ninhos e o areal se agiganta. “Está sempre tranquila”, conta Diogo Gouveia, “nunca há muita gente”. É por isso uma das suas favoritas, quando está na Lagoa de Santo André.
Outra é o Malhão, a nossa paragem seguinte abrigada por contrafortes. Já não é (tão) selvagem, mas não perde a beleza que Fernanda Almeida lhe conheceu há muitos anos, quando a sua filha ainda era pequena e descobria túneis nas rochas. Fernanda mostra este cantinho ao seu companheiro e continua encantada. “Será que ainda tem o comboio para o parque de campismo?
"A costa sequestrada"
Antes de descermos até à fronteira algarvia, voltamos ao início do nosso percurso: a Comporta e a zona de Melides, cheia de praias irrecusáveis e mais desconhecidas. Deixamos a Comporta entregue à sua fama para em Brejos da Carregueira de Baixo vermos a mudança neste litoral. "É pública mas não é", resume um segurança. Se antes se chegava à praia depois de subir as dunas, agora uma cancela corta o caminho - quem tem cartão de acesso (e casas no condomínio - dos mais assíduos: a família real monegasca), segue de carro, quem não tem caminha alguns quilómetros (20, 25 minutos). Talvez por isso cada vez menos gente se atreva a ir à praia, conta a funcionária de um café da vizinhança. "São 15 quilómetros das praias mais selvagens que encontramos na Europa", justifica o segurança, "esta é a forma de proteger".