A tarde já vai longa quando chegamos ao Santuário de Nossa Senhora do Minho, no alto da serra de Arga. Lá em baixo, todo o verde que acompanha o vale do rio Lima e, mais ao fundo, o horizonte azul-mar. Ambos desfocados por uma luz que parece queimar tudo à nossa volta e que combina tão bem com os aromas secos que nos envolvem. A visão de dezenas de garranos e alguns potros a correrem livremente pelos prados verdes ilumina-nos, porém, o dia. Mais ainda quando os últimos 10 ou 20 minutos (que pareceram uma a duas horas) foram passados caminho acima numa luta constante contra as vertigens.
Estancamos o carro para os deixar passar. O pêlo é tão brilhante que dá ideia de que são escovados no mínimo duas vezes por dia. Enquanto alguns correm desenfreadamente, outros deixam-se ficar deitados sob um abençoado sol. O barulho do motor não os impele à fuga, mas nota-se um estado de alerta geral. Às vezes alguns desaparecem para lá do fim do planalto; outros erguem-se vaidosos, mesmo à nossa frente, em brincadeiras equídeas. Tentamos captar o momento... Mas parece que adivinham a nossa intenção e depressa põem fim ao bailado.
Depois de alguns dias a percorrer o Minho, já não sentimos frustração e o momento não nos permite outra coisa senão sorrir. É que se há coisa que já concluímos é que esta região não é para gente apressada. Não que estejamos em território inóspito. Muito longe disso. Mas há algo aqui que exige paciência, tempo. Qualquer coisa que nos obriga a parar e a esperar. É que nada parece disposto a oferecer-se sem que antes nos provemos merecedores dos seus segredos.
Como nas lagoas de Bertiandos e São Pedro d"Arcos. "Às vezes pode levar horas para conseguir ver alguma coisa", sussurra-nos Marina Carvalho, da Elos da Montanha, que se prontificou, juntamente com Bruno Gonçalves, a ajudar-nos na imersão por esta área protegida. A "alguma coisa" a que Marina se refere são animais, aves na sua maioria, que procuram o fresco e o alimento das lagoas, sobretudo ao amanhecer ou ao anoitecer. "Nessas alturas é mais fácil." Chegamos, porém, com o sol demasiado alto para um festim visual. Por isso, o melhor mesmo é sentar, guardar silêncio e esperar, aproveitando o facto de, ao longo do percurso das lagoas, existirem alguns abrigos que nos permitem ficar camuflados (e recolhidos do sol que a meio da manhã já queima). Vamos trocando palavras em inaudíveis murmúrios, comunicando muitas vezes por sinais.
Talvez seja verdade que a hora ideal para observar os habitantes de Bertiandos seja ao nascer ou ao pôr do sol. Mas duvidamos que, nessas alturas, se sinta tanto prazer ao avistar um animal no seu quotidiano como sentimos após algum tempo de espera e de um escrutinar contínuo da nossa visão. Mais fáceis de observar foram alguns visons, espécie invasora proveniente da América do Norte, que se instalaram por aqui após terem sido libertados por uma fábrica têxtil de casacos de peles que encerrou, explicam-nos os nossos anfitriões. Verdade que quase que apetece agarrá-los, mas melhor não nos deixarmos levar pelo seu ar fofo: são bichos nervosos e violentos. Porém, no caso, a maioria não passa de jovens crias que vão brincando pelos ramos quebrados, mergulhando no pequeno carreiro de água, entrando na sua toca por um buraco para logo saírem por outro. Tal qual estivessem num autêntico parque de diversões.