Portos de fado
Retomamos o nosso roteiro para ver o rio Mira a encontrar o Atlântico. Vila Nova de Milfontes, na foz do rio, desemboca em praias fluviais afamadas - as Furnas, do outro lado do rio, até foi umas das eleitas no concurso Sete Maravilhas de Portugal versão praias. Esta é fluvial e marítima, apoiada por restaurante e no mês de Junho um sossego só. "É tudo nosso", diz Pedro Ferreira, que conhece a praia há 25 anos, mas nunca tinha vindo em Junho. Com a mulher e as filhas, vai explorando pedaços da praia todos os anos, descobrindo passagens pelas falésias e paredes de lousa lisas como ardósia.
Uma pequena odisseia espera-nos a partir do "caminho velho" de Longueira. Passamos campos de milho, casa abandonada, entramos em mato e cruzamo-nos com Nuno Marques e Elizabete Martins, que vieram de Lisboa por indicação de um amigo. Brejo Largo (N37.5833/W8.65) é o nome da praia: é difícil encontrar os degraus escavados na rocha e a experiência é vertiginosa - há areal grande, penhascos, uma garganta por onde entra o mar, queda de água. Há silêncio.
Almograve é a praia que se segue mas não é este enorme areal com quatro restaurantes encerrados que nos detém. Procuramos a praia da Foz do Ouriço (N37.657090/W 8.800273) e para tal percorremos o trilho da Rota Vicentina pela falésia, a partir do Almograve. Há um ribeiro que corre para o mar e do outro lado um areal aos pés de arribas - um casal aproveita a sombra e está só.
A indicação está no parque de estacionamento da praia do Almograve e nós seguimo-la até à Lapa das Pombas: dois quilómetros e chegamos ao pequeno porto, onde o almoço está quase na mesa. Aceitamos o convite e sentamo-nos com os pescadores na sua "cantina". Menu do dia: sopa de peixe.
Há cinco barcos para cinco pescadores no porto. "Já tivemos ajudantes, mas agora mal dá para nós", conta José Francisco Guerreiro. As restrições impostas pelas regras do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina tornam mais difícil uma vida que nunca foi fácil e não faltam críticas. Mas também há boas memórias, algumas delas a recobrir as paredes da barraca - fotografias de visitantes, de amigos de todo o mundo. "Às vezes, chegam grandes grupos de bicicleta"; e um dia chegou o projecto "Piano Trip". "Um francês trouxe um piano e fotografou-o lá em cima. Dormiram aqui."
Do fundo das escarpas que abrigam o porto subimos ao Farol do Cabo Sardão - alto o suficiente para, em dias limpos, se ver o Cabo de Sagres. Hoje, o nosso olhar detém-se "na Carrapateira, no máximo", avalia o faroleiro, e não vemos o falcão peregrino que aqui faz nidificação, nem sequer as cegonhas, presença habitual. "Os ingleses vêm de propósito pelas aves."
Graças ao faroleiro, seguimos para a praia da Carraca, na aldeia de Cavaleiro, a mais próxima do cabo. Não é uma praia óbvia: mais depressa nos apontam Almograve como "a" praia. O caminho parte da aldeia e passa por galinhas à solta. Uma família holandesa alojada num monte próximo assiste ao pôr do sol; durante o dia a praia tem sido deles, contam: uma baía com rochas que entram mar adentro como um barco partido.
Quando partimos para a Zambujeira do Mar, uma certeza: ir à praia do Tonel (N 37.681960º/ w 8.772 853º), para muitos a "rainha" da costa. Ouvimos as histórias da corda para a alcançar e t(r)ememos. O vento é forte no topo das falésias que fecham completamente a praia em meia-lua - os carros chegam até aqui, depois de passar campos agrícolas. Perscrutamos as arribas em busca da corda, que afinal começa a mais de metade da encosta: até lá, o carreiro esculpido na arriba não é tão assustador. Conquistado o medo, é um areal defronte de mar verde que se alcança.
Antes da Zambujeira do Mar passamos ainda a Entrada da Barca, porto abrigado por pequeno promontório, e vários miradouros para observação de aves e floras. Na Zambujeira, se a praia principal é sempre concorrida, as que orbitam próximas também não escapam: para Norte, Nossa Senhora e Nossa Senhora Pequena (N37.531282º/ W 8. 786292), esta mais "protegida"; para Sul, Alteirinhos, zona naturista oficial. O grande areal (quando a maré está baixa) tem natureza rochosa que acaba por providenciar "biombos" naturais que permitem um certo recolhimento para quem pratica nudismo, concentrados na parte Sul, sobretudo na pequena enseada que leva o nome de Meia Laranja. À entrada, ao lado de pequena cascata, Luís, na sua tenda árabe, oferece massagens full body e back, neck & head. Já esteve aqui o ano passado e "correu bem, com mais portugueses do que estrangeiros".
Sem estrangeiros estará quase de certeza a praia do Machado (N 37.636817/ W 8.792977), depois do Carvalhal. Com sorte estará deserta. Nós temos companhia de duas banhistas que como nós atravessaram campos e estufas, antes de entrar no túnel de árvores em caminho largo. O destino é mais uma vez uma arriba, a rodear uma praia em meia-lua e descida periclitante; para Norte há vegetação nas escarpas, rochas dividem a baía e o mar é tranquilo.
Quilómetros adiante, uma cópia mais pequena, mas mais difícil de alcançar. Novamente estufas, mas também um malmequer, indicam o caminho. O destino é a praia da Amália. Os carros ficam junto do portão da propriedade, porque a partir daí o percurso é a pé e não é fácil: de pinhal, passamos para túnel de árvores, caniçais, juncais com ribeiro a correr ao lado, no fundo. É quase um trekking, recompensado com uma baía plácida instalada em quarto de lua onde o ribeiro que nos acompanha chega por garganta rochosa.
Foi Amália Rodrigues que mandou construir as escadas que descem o penhasco, conta-nos o caseiro da propriedade, que agora faz a manutenção do carreiro público e da casa (que se aluga). A recordação de Amália ainda vive também na Azenha do Mar, onde António Xarila e a mulher nunca chegaram a aceitar o convite para irem à casa. As lides do mar não lhes deixavam muito tempo. Antes e agora. Indiferentes às praias que os rodeiam, continuam a preparar as redes para amanhã - que é já às 2h30: madrugada incipiente, António Xarila lançará as redes.
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Guia prático
Onde comer
Tia Rosa
Fontainhas do Mar (na estrada Melides-Comporta)
7570-504 Melides (Grândola). Tel.: 269 907 144
Especialidade: pato assado
A Ilha
Praia da Ilha do Pessegueiro
7520-421 Porto Côvo (Sines)
Tel.: 269 959 207; 963 329 898/ 963 320 897
Especialidades: cataplana de tamboril, arroz de marisco, açorda de marisco, cataplana de amêijoa com carne de porco, carne de porco à alentejana, feijoada de chocos, búzios, caldeirada.
Tasca do Celso
Rua dos Aviadores, 39
7645-225 Vila Nova de Milfontes (Odemira). Tel.: 283996753
www.tascadocelso.com
Especialidades: bife à la plancha, cabrito assado, açorda de camarão, peixe fresco, amêijoas à tasca, linguiça com ovos mexidos.
O Josué
Rua José António Gonçalves, 87. Longueira. 7630-084 Odemira
Tel.: 283 647 119; 936 520 048
Especialidade: marisco.
Barca Traquitanas
Entrada da Barca. 7630 Zambujeira do Mar
Tel.: 283 961 186
Especialidades: caldeirada à pescador, choco à Barca, filetes de peixe pampo, migas com carne de porco, pica-pau do lombo frito em azeite, marisco.
Restaurante da Azenha do Mar
7630 - 564 S. Teotónio (Odemira)
Tel.: 282 947 297
www.facebook.com/pages/Restaurante-A-Azenha-do-Mar/263213220990
Onde dormir
Quinta do Moinho Velho
Melides. 7570-650 Grândola
Tel.:269 907 323
www.moinho-velho.com
GPS: N 38 08 767/ W 8 44.908
Três Marias
Ribeira da Azenha, Apt. 111
7645-909 Vila Nova de Milfontes
Tel.: 965 666 231
GPS: 37°47'34.60"N / 8°45'21.12"W
Monte das Alpenduradas
7630-732 Zambujeira do Mar
Tel.: 283 961 617
www.alpenduradas.com
GPS: 37º31'41''N 8º45'39''E
A fazer
Museu do Arroz
Herdade da Comporta. Tel.: 265 499 950
www.herdadedacomporta.pt/pt/turismo/museu-do-arroz
Horário: De terça-feira a domingo das 10h às 13h e das 14h30 às 19h30.
Numa antiga fábrica de descasque de arroz, espaço para conhecer a orizicultura e perceber a importância deste cereal na região.
Reserva Natural das Lagoas de Santo André e Sancha
(GPS 38°06'46.99 N/Longitude: 8°47'49.34 W)
Da Lagoa de Melides, entrando por território da Reserva Natural das Lagoas de Santo André e Sancha, bem junto à costa, descobrimos um mundo rico de botânica e ornitologia.
Castelo de Sines
Rua do Muro da Praia . 7520-151 Sines
Tel.: 269 632 237
Horário: De terça a domingo, das 10h às 13h e das 14h30 às 18h (horário de Verão). Entrada livre
Além da fortaleza com vista para as praias e porto, encontra-se o núcleo sede do Museu de Sines e a Casa de Vasco da Gama, que se acredita ter nascido aqui.
Ilha do Pessegueiro
Construções romanas e fortim quinhentista são vestígios de uma ocupação que durou desde o século III a.C. até à queda do Império Romano e voltou nos finais do século XVI com o projecto de construção de um porto artificial que nunca foi concluído.
Miróbriga
Chãos Salgados (Santiago do Cacém)
Tel.: 269 818460
Horário: De terça a sábado das 9h às 12h30, das 14h às 17h30; domingo: das 9h às 12h, das 14h às 17h30.
Preço: 3€ (gratuito aos domingos e feriados até às 14h)
(GPS N 37º 59' 17.57'' ,W 8º 41' 15.17'')
Um dos testemunhos mais relevantes da ocupação romana do actual Sudoeste português. Dois quilómetros de ruas pavimentadas, que nos levam por ruínas de um hipódromo, termas, o fórum, uma ponte e edifícios residenciais.