É um cenário diferente, o que acolhe os visitantes à Berlenga. Saímos do barco no cais, em frente à praia do Carreiro do Mosteiro, que já está na sombra nesta tarde, e somos atropelados pelo movimento: quem vai para os barcos, quem se estende no pontão em busca do sol, quem abre as arcas frigoríficas para improvisar um piquenique. Para cima fica o restaurante, o “castelinho” (um café em antiga atalaia), o bairro dos pescadores encavalitado, o parque de campismo em socalcos despidos acima da praia.
Mas nenhuma volta à Berlenga fica completa sem um passeio de barco pelas suas grutas, dizem-nos. Nós acreditamos e não nos arrependemos. “Abençoado pedreiro que se ocupou desta pedra”, lança o nosso timoneiro, David Silva. Há cavernas, “pontes” e até uma “catedral”; passamos a “pedra da baleia” e a “tromba do elefante”. Em algumas grutas podemos entrar, como a São João Baptista, em frente ao forte seiscentista (agora pousada) do mesmo nome, cor branca e mistura de água doce com salgada; mais à frente descobrimos outra com águas turquesa. O Furado Grande é um túnel que o nosso barco pode atravessar para desembocar na Cova do Sono, habitual porto de abrigo onde se exibe a abóboda de 92 metros que é a “catedral” e onde se cai na Cova do Leão. Passamos por caiaques, mergulhadores, outros barcos e saímos para regressar por fora destes caminhos aquáticos. Agora é a flandres (porto abrigado, na gíria) que miramos — veleiro ancorado e a encosta por cima coberta de chorões, que na Primavera colorem a ilha de lilás — antes de voltarmos ao porto de partida pelo Carreiro da Inês.
Foi de Peniche que partimos para a Berlenga. “Não está mar de senhoras”, avisaram, há alguma ondulação. A viagem segue a costa, penhascos rochosos com plataformas onde se vêem pessoas, até ao Cabo Carvoeiro. Parte à vista do Forte de Peniche (39°21’12”N 9°22’52”W), que do mar ou de terra se vê degradado. Há muitos visitantes, mesmo que não saibam ao que vão. “Foi uma prisão?”, interroga-se um grupo, ao entrar no parlatório; “É um museu de conservas?”, pergunta-se à entrada do museu. A entrada do forte é clara q.b.: há placas “aos resistentes anti-fascistas” e a assinalar o “X aniversário da libertação dos presos políticos”. Mas é no terceiro andar do museu (onde nem todos entram — paga-se —, preferindo ficar nos pátios, tirando fotografias nos baluartes e ameias) que a história de prisão do Estado Novo é mais evidente, na sucessão de celas. “Está abandonado, não está?” A pergunta da senhora é de retórica. Indaga ainda pela cela de Álvaro Cunhal — indicam-lha e a exposição dos seus desenhos. A saída do museu tem um cravo por cima das palavras de Sofia de Mello Breyner Andresen. Com ela “emergimos da noite e do silêncio” para “o dia inicial inteiro e limpo”.
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GUIA PRÁTICO
O que fazer
Parque de Escultura Contemporânea do Almourol
Sete hectares relvados com obras Alberto Carneiro, Pedro Cabrita Reis ou Joana Vasconcelos, por exemplo.
Passeios no Tejo
Há várias empresas que oferecem passeios pelo rio, entre mouchões. A Fugas foi convidada
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