E os restaurantes, como é que os avalia, toma notas?
Só tomo notas mentais, mas estou atento a tudo, analiso tudo. Para mim, um restaurante não é apenas o prato, excepto aqueles muito técnicos em que não há mais nada além do prato. Nesses casos concentro-me no prato, mas para mim é um conjunto de factores.
O cheiro, a música, a iluminação, as sensações, o pessoal. É um todo. Não posso dizer às pessoas para irem a um lugar que é triste ou austero. Tenho que lhes relatar isso, descrever bem a experiência a todos os níveis. As coisas têm de estar bem calibradas.
Mas os factores de avaliação têm um peso diferente.
Depende. Penso que em cada lugar, seja numa crêperie, num balcão japonês, num restaurante italiano, num gastronómico ou num café, têm que se adequar os instrumentos de medida. E dizer 'esta crêperie é muito boa'. Mesmo que o espaço não seja muito confortável e tenha um cheiro intenso, mas onde o crepe é bom, e o ambiente é agradável e genuíno. Tem que se ter alguma flexibilidade e não certezas absolutas.
Mas valoriza mais a comida?
Sim, mas às vezes a comida é média e está tudo bem. É o tal conjunto. A comida tem que ser no mínimo correcta, mas não tem que ser necessariamente muito boa, aí pode prevalecer o ambiente, a simpatia. Se vou comer um bife com batatas fritas em que a carne está no ponto, as batatas são boas e o ambiente também, é perfeito!
Nasceu em Saint-Nazaire, a cerca de 500 quilómetros de Paris. Que memórias guarda de lá?
Fica a 450 quilómetros de Paris, à beira do mar, na foz do rio Loire. É uma cidade especializada em construção naval com estaleiro. Não tem uma gastronomia específica, é um lugar simples com um pequeno porto.
Não tem referências fortes da cozinha local.
Não, mas por outro lado era uma zona banhada por fortes odores marítimos, cheirava a peixe e a café. Junto à minha casa havia uma fábrica de café. Estes aromas foram duas sensações fortes ao nível do gosto que me marcaram.
Viveu lá a sua infância?
Sim, até aos 18 anos, mais ou menos, e a seguir fui para Nantes. É uma cidade vizinha que fica a 65 quilómetros. Fiz o curso de Direito mas acabei por seguir a minha vocação, o meu sonho de infância, que era ser jornalista. Quando tinha 27 anos vim para Paris, já como jornalista.
E começou a escrever sobre gastronomia na Gault&Millau?
Em 1981, comecei no meio de Maio. Nessa altura a revista estava à procura de um jornalista, eu fui mas disse-lhes que não sabia nada sobre comida. Eles disseram que não havia problema porque ia aprender com eles. Acabaram por não me ensinar nada e preferiram empurrar-me para a piscina. Tive que aprender a nadar sozinho. Aprender a degustar.
Como é que se aprende a degustar?
Tem que se estudar, observar, escutar. Não tem que se ser um grande especialista. Quando se é demasiadamente apaixonado e especializado, é difícil manter o distanciamento. E para mim o distanciamento é o ponto mais importante para se fazer crítica [pega na garrafa de água que está em cima da mesa e exemplifica].
Se estamos muito perto de um objecto temos dificuldade em analisá-lo. Temos de conseguir ver as três dimensões [afasta a garrafa], porque se estivermos dentro da garrafa é impossível. Para mim os apaixonados, os especialistas, estão perdidos no interior da garrafa e querem estar lá dentro. Pensando na gastronomia como se fosse uma casa, eu prefiro estar aqui [distante].