Para o molho é feita uma redução de vinho com chalotas à qual se junta crème fraiche, trufas picadas e vários produtos da horta. A mioleira, que é panada e cortada ao meio, tem um toque crocante no exterior que contrasta com a textura no interior, e há ainda uma minitosta de pão com o tártaro de cabrito e chips de tubérculos. No meio disto tudo, rebentos de flores, “que dão um toque ácido e refrescante”.
Não será um prato fácil de vender, mas, garante, é tão bom que vai entrar no menu de degustação do 100 Maneiras. Reconhece que o problema de um prato como este é quando se descreve o que ele tem. Muitas pessoas travam a fundo logo que ouvem falar de entranhas e, sobretudo, de mioleira. Claro que chamar-lhe Inside the Mind pode ajudar… ou talvez não.
Até na sua cozinha houve elementos da equipa que disseram “nem pensar”, não iam provar aquilo, mas quando viram o prato pronto, acabaram por não resistir e gostaram imenso. Ou seja, para além de “ter tomates”, é preciso ter confiança no chef. E se ele diz que, em matéria de entranhas não há nada melhor… vamos a isso?
Pedro Almeida
Tempura de carapau (e outras coisas)
“Se apresentasse este prato a um cliente estrangeiro, a reacção dele seria ‘não, obrigado’”, garante Pedro Almeida. Mas o chef do Midori, na Penha Longa, Sintra, está confiante de que pelo menos alguns portugueses avançariam sem medo para o que aqui nos propõe.
E de que se trata exactamente? Traz para cima da bancada um prato com carapaus, uma cabeça de pampo e algumas facas. “Isto que vos vou mostrar é uma coisa que os japoneses adoram no carapau, no bacalhau e no fugu, ou peixe-balão”. Abre a barriga de um carapau e extrai do interior algo que parece um saco de ovas mas com uma textura diferente, mais lisa, e de cor mais esbranquiçada. “É o saco de esperma do carapau.”
Começamos bem, portanto. Breve explicação sobre os métodos de reprodução dos peixes — o esperma é lançado na água, onde encontra os ovos e os fecunda — para nos esclarecer sobre o tamanho do saco. Coloca-o debaixo de água corrente e lava-o cuidadosamente. “O sushiman tem que estar muito treinado, porque é preciso encontrar os parasitas que o peixe possa ter, uma espécie de ténia que se aloja nos intestinos.”
Totalmente limpo, o saco de esperma é posto num prato enquanto avançamos na tarefa de aproveitar o que raramente se aproveita de um peixe. Da cabeça de pampo, Pedro Almeida extrai primeiro as bochechas. “As cabeças de peixe eram uma coisa que se comia antigamente e hoje toda a gente está a fugir delas.”
Depois vira o peixe e, com gestos firmes, tira-lhe as guelras. As guelras também?, pensamos. Mas tudo bem. Confiamos. “Daqui a única coisa que podemos aproveitar é aquilo a que chamamos a crista, que é uma cartilagem. O sabor não é uau, mas é supercrocante.” No Japão, isto não surpreenderia ninguém porque “eles são exímios a aproveitar todo o peixe”. Incluindo a espinha, que o chef põe a fritar depois de lhe retirar, com toda a perícia, os filetes. Também as guelras já estão a fritar.