Miguel Laffan
L’And Vineyards, Montemor
Quadro: Avant la corrida
Prato: Pescada escalfada num creme de iodado, alho francês e codium, folhas de ostra
Foi a suavidade da composição de Amadeo em Avant la corrida que primeiro chamou a atenção de Miguel Laffan. Confessa que não conhecia a obra do pintor e isso tornou este desafio ainda mais interessante, obrigando-o a ir pesquisar. No entanto, quando começou a pensar no quadro teve poucas dúvidas sobre qual o caminho a seguir. “Era complicado representá-lo geometricamente, por isso inspirei-me mais nas tonalidades e nas cores, os verdes, os cremes, o pastel.” Percebeu também que tinha que dar a si próprio alguma liberdade criativa porque a ideia não era transpor um quadro exactamente igual para a mesa mas sim interpretá-lo com um olhar próprio. “Não fiquei obcecado em representá-lo, isso seria extremamente complexo.” E assim, jogando com sabores de mar, também eles suaves, e cores pastel, criou o seu prato.
Rui Silvestre
Bon Bon, Algarve
Quadro: Mucha
Prato: Linguado, funcho, beterraba e sumo de azeitona galega
Também Rui Silvestre começou por pensar nas cores, estas fortes e quentes, do quadro que lhe apresentaram. “Mas depois achei que não fazia sentido ir por aí e decidi ir mais pelas texturas.” Sentiu que a pintura de Amadeo era “uma harmonia um bocado caótica” e por isso quis seguir esse caminho. O prato que fez, apesar da brancura do linguado e do pedacinho de choco, tem também cores fortes, da beterraba e do sumo de azeitona, e tem sabores contrastantes, entre a subtileza do peixe e a doçura do funcho. Dispara em várias direcções, como o quadro, mas cria uma unidade dentro desse caos aparente. Rui só tinha tido uma experiência anterior de criar a partir de uma fonte de inspiração exterior à cozinha, mas tinha sido com música e não com pintura. “É interessante perceber como eu interpreto de uma maneira e se calhar outro chef interpretava o mesmo quadro de outra maneira totalmente diferente. É uma experiência — se calhar no futuro vai servir-me para outras coisas.”
Ana Moura
Cave 23, Lisboa
Quadro: Trou de la Serrure Parto da Viola
Prato: Rabo de vitela, sapateira, cânhamo, malagueta indiana, lima kafir
Antes de o prato de Ana Moura chegar à mesa, chegou um papel com a explicação de como a chef tinha partido de um quadro “que combina os mais variados elementos, desde as colagens cubistas e os discos da pintura de Delaunay, até aos objectos de inspiração popular portuguesa como sejam a viola, a olaria, a boneca de trapos e os morangos”. Ana destacou alguns destes elementos e, brincando também com as linhas rectas da pintura, transpôs para o seu prato uma parte da composição, reorganizando o quadro de acordo com uma lógica própria. “Estava à espera de um quadro simples e este tinha mil e uma coisas”, diz. “Tentei, sem saber muito de arte, perceber o que me transmitia visualmente. Tem muitas linhas rectas, tem o voyeurismo do buraco da fechadura, pensei num prato inspirado um pouco no erotismo.” Daí a malagueta, por exemplo. Aliás, todo o prato é feito de sabores fortes e cores intensas, a par de pequenos piscar de olho como a pétala de rosa com lemon curd e ovas ou o caviar de cânhamo em pickle de spirulina.