Era impossível que um grupo de sete chefs de cozinha, fardados com jalecas e tudo, passasse despercebido no meio do Mercado dos Lavradores, no Funchal. Havia grupos de curiosos no topo das escadas a observar a zona de venda do peixe enquanto os chefs conversavam com os vendedores, gente de telemóvel em punho a filmar toda a agitação, pescoços esticados para ver melhor o que se passava.
E o que se passava era simples. Luís Pestana, chef do restaurante William, do Belmond Reid’s Palace, guiava pelo famoso mercado os seus convidados para a Rota das Estrelas que, nos dias 23 e 24, passou pelo William pela primeira vez (foi no final do ano passado que o restaurante conquistou a sua primeira estrela Michelin).
A acompanhar Luís Pestana vinham Joachim Koerper, do Eleven (uma estrela), em Lisboa e chef consultor do William; Kazuo Harada, do MEE – Belmond Copacabana Palace no Rio de Janeiro (uma estrela); Michel van der Kroft, do ‘t Nonnetje, na Holanda (duas estrelas); Vítor Matos, do Antiqvvum, Porto (uma estrela); Rui Silvestre do Bon Bon, no Algarve (uma estrela); e ainda Pedro Campas, chef de pastelaria do William.
Com a noite de São João dali a algumas horas, nas bancadas de pedra dos vendedores do mercado via-se o gaiado seco, pronto para ser petisco nas festas, e o atum, a curar em sal com alho e orégãos. Mas o que prendeu as atenções dos chefs — e sobretudo do brasileiro Kazuo Harada — foi o atum que acabava de chegar e que era o que procurava para o prato que ia servir nessa noite no William.
Kazuo nunca tinha estado em Portugal e começara esta visita precisamente pela Madeira. Por isso, tudo o que via parecia-lhe novidade. “Achei que a ilha da Madeira fosse menor”, confessa. Sabia, no entanto, que iria encontrar bom peixe. “Tenho muitos amigos portugueses no Brasil e sempre me falavam do pescado e dos frutos do mar. Olhando o atum, vejo que é muito melhor que o nosso.” À noite irá servi-lo selado com molho de miso e pimenta doce e acompanhado por uma ostra com gema de codorniz, ouriço e molho ponzu.
Na véspera, num passeio pela Camacha, tinha, juntamente com os outros chefs, sido convidado para um almoço no qual foram servidas as célebres espetadas da Madeira, que Kazuo não conhecia. Tal como, conta-nos agora, não sabia que tinham sido os portugueses a levar a cana do açúcar para o Brasil. “Pensava que tinha vindo do Brasil para a Madeira”, admite, sorrindo.
Mas se para o chef do restaurante asiático do Copacabana Palace tudo é novidade, para o holandês Michel van der Kroft estar aqui é estar em casa. Casado com Maria do Céu, uma portuguesa da serra da Estrela — “e apaixonado há vinte e cinco anos”, diz, com um sorriso a iluminar-lhe o rosto — é um admirador absoluto dos produtos e da cozinha portuguesa.
Chama-nos porque, na zona dos legumes, encontrou umas “cenouras maravilhosas” para o prato que vai preparar e que é uma homenagem a Portugal: dim sum de porco preto com rábano, alho fermentado e jus de cenoura picante. Já para provar o prato que fez em homenagem à mulher, raviolli com queijo Serra da Estrela, acompanhado pelo vinho Conciso, de Dirk Niepoort, será preciso ir até à Holanda.