Fugas - restaurantes e bares

  • Bruno Calado
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Há um novo vizinho no bairro. E veio do Peru

Um exemplo? “As gastronomias da montanha e do mar são diferenciadas mas juntam-se. Um ceviche, que para ti poderia ser um prato tipicamente da costa, também é feito na serra, com a mesma base, a mesma quantidade de acidez, mas com um feijão seco, o tarwi [em vez de peixe]. É muito amargo porque tem muita saponina, que é uma defesa natural contra os insectos, e as pessoas deixam-no a lavar no rio durante duas semanas.”

Então o que é um ceviche? A definição vem realmente com peixe, apesar das variações possíveis: “O ceviche antigo peruano era apenas sal, peixe fresco e ají; chegaram os espanhóis e acrescentaram o sumo de lima, ou limão, e cebola. Um ceviche purista só tem estes cinco ingredientes e muito amor, porque estes cinco ingredientes têm que ser o que de melhor existe.”

A ideia de trazer a gastronomia peruana para o Bairro “fez parte do projecto inicial, mas depois quisemos abrir e ver como tudo corria antes de decidir”, conta Avillez. “Gosto de pensar que temos no andar de baixo uma representação do melhor que há na cozinha portuguesa, num estilo mais criativo: desde a taberna com petiscos e pequenos pratos a um olhar para o início do século passado, ali no Beco”, afirma.

Há alguns pontos de contacto entre as duas gastronomias: “É uma cozinha que se compara com a nossa pelo sabor intenso e uma simplicidade dos produtos e das confecções. O lombo salteado é parecido com o nosso pica-pau. Mesmo as empanadas [são parecidas com] as nossas empadas, com técnicas de confecção diferentes porque as empanadas são fritas, mas reconhecem-se sabores. Usamos muito os coentros, que na cozinha peruana são utilizados de maneira um bocadinho diferente: estão na base de muitas preparações do leite de tigre, nós usamos mais para finalizar.”

Mas não é tanto pelas semelhanças que a Cantina se instalou no Bairro. “Achei que deveria haver um olhar sobre o mundo, e, neste caso, sobre o mundo peruano. O Peru é um dos países que tem ele próprio essas influências todas.”
Para além da gastronomia pré-colonização, e do que esta depois transformou, há uma forte influência trazida pela vaga de imigração chinesa e japonesa de finais do século XIX e início do século XX, criando as cozinhas chifa e nikkei, respectivamente.

A carta foi dividida como “uma miniviagem através do país, geográfica e culturalmente”, que termina na “costa, serra e selva” com as sobremesas criadas pela confluência entre as culturas inca e espanhola (há, por exemplo, um gelado de lúcuma, um fruto dos Andes, e um torrão de anona).
Começamos pelo princípio: “Com a costa vem o mundo frio, com toda a versão de ceviches e tiraditos [peixe cru fatiado].” O peixe é preparado na sala, à vista de todos. Há um “ceviche de gambas da costa” onde fica bem clara a tal valorização dos produtos do mar português de que falava Muñoz.

Entramos na cozinha para seguir viagem. “Aqui temos o mundo das brasas: das ruas de Lima vem uma confecção com influência africana que se tornou um prato de nocturno. As senhoras assavam coração de boi, com molho de ají panca, em fogo de lenha. Com esta inspiração fizemos um frango com influência japonesa, polvo, e porco ibérico.”

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