Fugas - Viagens

Manuel Roberto

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Macau - A corrida mais louca do mundo ainda vai a meio

A diferença fundamental é que o nível competitivo é tão sofisticado que as artimanhas - tão naif e inconsequentes no contexto original - são obrigadas a acompanhá-lo. Talvez não. Na verdade, a diferença maior é que, nesta corrida, a vitória de um concorrente é quase obrigatoriamente a vitória do outro. Seja como for, lá vão eles lançados na frente: o jogo, o entretenimento e as compras.

E faz sentido, se olharmos para a entourage que os envolve. É um exército de trabalhadores a puxar (os clientes) para o mesmo lado e a reduzir a mínimos históricos a taxa de desemprego na cidade. Aqui, o George "exterminador-de-postos-de-trabalho" Clooney que enche o ecrã em Up in the air (Nas Nuvens) teria dificuldade em sobreviver. O momento é de aceleração, não de encostar às boxes.

Inveja. Inveja talvez não seja a palavra certa, mas é a primeira que nos vem à cabeça.

Quão ofuscante será o futuro?

Joyce, Chloe Chong, Simpson Lei, Annie Lao são apenas alguns dos jovens rostos que nos saíram ao caminho durante esta visita relâmpago e um exemplo do bom momento de forma que a região atravessa. Macau confia-lhes a arte de bem receber e eles respondem com competência e muitas horas de trabalho. Faltou-nos, porém, um dedo de conversa com o relações-públicas do Hotel Grand Emperor.

Viemos aqui parar para provar que não nos esquecemos da (verdadeira) excentricidade, da rainha das extravagâncias, da chanceler da ostentação. Estão preparados? Imaginem o que é entrar no lobby e perceber que olhar para o chão nunca fez tanto sentido. Imaginem o que são 78 barras de ouro de 1kg sob os nossos pés, distribuídas num anel de brilho ofuscante. Pode até ser demasiado kitsch, mas, acreditem, quando o certificado do tesouro está a um palmo do nosso nariz, quando a sola das nossas Camper está a pisar a fortuna que nunca teremos, apenas por capricho decorativo, chega a ser ridículo ficar indiferente.

Chamam-lhe Caminho Dourado e percebe-se porquê - para isso não precisávamos da assistência de nenhum relações-públicas. Precisávamos, sim, que nos dissesse se faz sentido alargar este rótulo a toda a cidade; se é possível manter os (quase estratosféricos) padrões de oferta turística por muito tempo; se a herança de um território tão reduzido não corre o risco de ser engolida pelo furacão económico.

Incógnita. Incógnita talvez não seja a palavra certa, mas é a primeira que nos vem à cabeça.

"Aura cinza prata"
As pinceladas de identidade do território

Da mesma forma que não se diz a um habitante de Pisa que a torre precisa de correcção "ortopédica", não deve falar-se de nevoeiro com ligeireza quando se entra em Macau. Mesmo que na viagem de barco de Hong Kong até ao cais da cidade os vidros nos pareçam cinzentos. Mesmo que do alto dos edifícios tenhamos de redefinir o conceito de vista panorâmica. Nevoeiro não entra aqui.

Pelo menos nesta conversa de café não deveria ter entrado. Estamos a vigiar o rio das Pérolas em plano picado e o desabafo sai naturalmente: "Este nevoeiro é já uma imagem de marca?" O aceno de cabeça mostra que errámos o alvo, mas há cortesia suficiente na resposta para nos tirar qualquer esboço de desconforto. "É mais uma aura cinza prata".

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