Os primeiros mergulhadores caem na água, que ronda os 21 graus. Nada mau para quem está habituado a mergulhar no continente, em Sesimbra, com temperaturas médias de 15 graus. Equipados a rigor — fato de neoprene, cinto de chumbo à cintura, barbatanas, colete com garrafa às costas, máscara e regulador —, deixamo-nos cair também.
É como se entrássemos num aquário gigante, sem paredes, onde quase não se vê o chão. Cardumes de encharéus, lírios, bicudas, aqui e ali um peixe-porco, peixes-rainha e outros peixes coloridos tropicais, ou não fosse esta a única ilha dos Açores que repousa na placa geológica africana. À entrada de uma gruta, um enorme ratão, primo das raias, com a sua grande cauda apontada para fora. Mas de jamantas, nem sinal.
Voltamos a bordo e preparamo-nos para um segundo mergulho. O semi-rígido “estaciona” a poucos metros do ilhéu, sobre a Baixa do Sul. As baixas, elevações do fundo marinho que chegam por vezes a escassos metros da superfície, são frequentes nos Açores. Estendemos o olhar sobre a água cristalina à procura de um sinal do peixe-diabo (outro nome dado à jamanta), que muitas vezes nada junto à superfície. Nada.
Encontros imediatos
Outra vez a corrente — e outra vez o enjoo. Descemos o mais rápido que podemos agarrados ao cabo que segura o barco ao fundo do mar, e seguimos atrás dos guias. A visibilidade de 20 a 30 metros torna tudo mais fácil. Avistamos logo um grande mero, como que a levitar sobre as algas que forram o fundo, entre duas rochas. Aproximamo-nos para o ver de perto e ele continua ali, quieto, com os seus grossos “lábios” e os olhos salientes, que parecem observar-nos, curiosos. Mais à frente, outro mero sai de um buraco na rocha e vem pedir atenção. E enquanto agita as barbatanas num jeito desalinhado, deixa-se tocar.
Os meros são uma das fortes atracções dos Açores. Por se manterem quase sempre no mesmo sítio e terem um comportamento amistoso com os mergulhadores, são fáceis de encontrar e deixam qualquer um enternecido.
À nossa volta, novamente cardumes prateados de lírios, bicudas e encharéus. Encontramos moreias escondidas nas rochas, vejas (peixes de escamas largas e com um bico que parece de papagaio) e corais.
De repente, ouvimos o som metálico das maracas que o guia usa para chamar o grupo. É como música para os nossos ouvidos. Como que saídas do nada, surgem ao longe duas jamantas — as tão esperadas Mobula tarapacana — que rasgam o azul num voo livre, uma atrás da outra, a 20 metros da superfície.
Tentamos nadar até elas mas a injecção de adrenalina é tanta que, no meio de uma cãibra, mal saímos do lugar. Nada do que nos ensinam no curso de mergulho sobre como tirar uma cãibra resulta quando mais precisamos.
Desistimos e ficamos ali a pairar, inebriados. E em menos de nada, as jamantas, que nadam em círculo à volta do grupo de mergulhadores, passam mesmo aos nossos pés, devagar (pelo menos, aquele minuto parece demorar uma eternidade). Nunca o ditado “se Maomé não vai à montanha, a montanha vai a Maomé” fez tanto sentido.