Fugas - Viagens

  • Ataco é apontada como uma das mais pitorescas cidades coloniais de El Salvador
    Ataco é apontada como uma das mais pitorescas cidades coloniais de El Salvador JOHN COLETTI
  • Ataco
    Ataco DR
  • A igreja domina a praça  de Juayúa
    A igreja domina a praça de Juayúa JOHN COLETTI
  • As ruínas de Tazumal
    As ruínas de Tazumal ULISES RODRIGUEZ/REUTERS

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El Salvador, as flores de um segredo que é nosso

- Que quieres tomar? Aqui tienes. Te gusta El Salvador? La gente es muy amable pero hay que tener siempre cuidado. Te gusta?

- A cerveja?

Confundira-me, o volume de questões, mas ainda fui a tempo de emendar.

- Sim, muito, um povo adorável.

Peço licença para me retirar, com o pretexto de que se impõe uma visita à cidade, e caminho ao longo das ruas vedadas ao trânsito, por entre tendas que, enchendo os passeios, vendem de tudo. Os tambores rufam agora no Conga Bus, os corpos ameaçam desintegrar-se, um tumulto de festa, cujo eco flutua no ar, contagia novos e velhos. A igreja, mais uma de fachada branca mas com janelas e porta debruadas a tijolo, domina a praça; no interior, três mulheres conversam através de murmúrios indecifráveis a curta distância de uma velhinha que, erguendo os olhos para a imagem de Cristo na cruz, afaga as contas do rosário nos seus dedos nodosos. Lugar de peregrinação, atrai multidões que se inclinam perante o Cristo Negro, esculpido na parte final do século XVI por Quirio Cataño, artista com raízes portuguesas que também assinou o trabalho do homónimo de Esquipulas, na Guatemala, maior centro de peregrinação católico da América Central e palco do encontro, na década de 1980, de todos os presidentes centro-americanos, visando o fim do conflito na Guatemala e em El Salvador.

Também Juayúa, meio século antes, se cobriu de sangue, na sequência da insurreição dos camponeses — contando com o apoio do Partido Comunista Salvadorenho —, motivada pela crise económica resultante da dramática descida dos preços do café nos mercados internacionais. Um protesto reprimido de forma violenta pelo exército e que provocou dezenas de milhares de mortos entre a população indígena, em Juayúa, Izalco e Salcoatitán. Agora, de volta à praça, cada vez mais impregnada de sons festivos, esses tempos parecem distantes. O casal, já sem os filhos por perto, saúda-me efusivamente e o cantor, com os seus trejeitos femininos, passeia-se por entre o público eufórico, agradecendo os aplausos e as notas de dólar com que o presenteiam.

- E, tal como prometido, uma música dedicada a…

Não consegui perceber o nome, pronunciado no momento em que um foguete estalou nos céus, mas aquelas palavras alertaram a minha consciência para a necessidade de partir, uma vez mais, de autocarro.

- Então, por aqui de novo? Quem promete, cumpre. E muito mais pontual do que um autocarro. Viste muitas flores?

No rosto, uma expressão sarcástica.

- Sabes, durante o século passado, como resultado do aumento da população e do cultivo em excesso das terras, o país foi drasticamente desflorestado, provocando o desaparecimento de muitas espécies de plantas e de animais.

Ela não parece mostrar muito interesse na minha exposição mas, ainda assim, prossigo:

- Uma grande variedade das plantas indígenas desapareceu mas ainda se pode falar em qualquer coisa como 2900 tipos, muitas delas existentes em áreas protegidas e, ainda que em menor número, ao longo da Rota das Flores.

Ela hesitou, depois, mexendo no cabelo, perguntou:

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