EUA. Geórgia
Scarlett O’Hara e Rhett Buttler
“Afinal, amanhã é um outro dia.” Começamos pelo final, teatral, do filme E tudo o vento levou porque, na verdade, esta é uma história de sobrevivência. De tudo, menos, talvez, do amor sempre desencontrado de Scarlett O’Hara e Rhett Buttler. E começamos pelo filme porque foi ele que se instalou no imaginário de gerações ao longo dos últimos 75 anos (a cumprir em 2014). É que se antes deE tudo o vento levou chegar ao grande ecrã como uma das maiores extravagâncias cinematográficas de sempre ele foi, é, um livro vencedor do prémio Pulitzer, ninguém consegue imaginar outra Scarlett que não Viven Leigh ou outro Rhett que não Clark Gable. Eles, ela, sobretudo, são os motores deste grande fresco sobre o sul dos EUA durante e após a Guerra Civil, que dividiu o país numa luta fratricida que colocou em confronto dois modos de vida — o agrário e esclavagista do Sul e o industrial e não esclavagista do Norte — e que ainda hoje ecoa nesse território da Dixie.
Não é um amor linear. É tudo menos altruísta, vivido por dois protagonistas egoístas e narcisistas q.b.. Scarlett é uma jovem southern belle, inconsequente e fútil, Rhett é um homem mais velho, cínico e pragmático; ela tem uma paixão não correspondida, ele apaixona-se pela sua paixão. A vida despreocupada do início do filme é abalada pela Secessão, guerra e reconstrução que põem à prova a capacidade de sobrevivência dos protagonistas e tornam (ainda mais) ínvios os caminhos deste amor turbulento que nunca é total. Quando, finalmente, Scarlett percebe que sempre amou Rhett, é tarde de mais — ele já desistiu dela.
Ela decide aí deixar Atlanta e voltar a casa, a plantação familiar, Tara, perto de Jonesboro. É aqui, no Norte da Geórgia, que se pode visitar a Stately Oaks Plantation, construída em 1839 e que terá servido de inspiração a Margaret Mitchell para a sua Tara. Ainda antes de regressarmos a Atlanta, sempre no espírito sulista antebellum e das memórias da guerra, temos mais plantações cristalizadas no tempo, cemitérios confederados e unionistas, campos de batalha, museus — o mais famoso, em Marietta, Scarlett on the Square guarda objectos e memorabilia do filme. Do livro e da sua autora guardam-se memórias na Casa Margaret Mitchell, em Atlanta. A casa-museu faz parte do Centro de História da cidade, um complexo com casas históricas recuperadas e a maior exposição de artefactos da guerra civil.
Além de Atlanta, Savannah e Charleston (Carolina do Sul) fazem parte da geografia de Rhett e Scarlett — cidades históricas, à beira-mar, preservam uma riqueza arquitectónica invulgar que reflecte uma história intensa. São duas ilusões, Scarlett e Rhett, mas um bom pretexto para descobrir um mundo que o vento levou, deixando como herança o famoso charme sulista, onde haverá sempre a chama do amor de ambos, que ardeu até à exaustão.
França. Paris
Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre
Paris é uma festa, disse-o Hemingway e continuam a dizer muitos. Mas depois da festa do escritor norte-americano — e de muitos dos seus camaradas de ofício expatriados —, Paris foi também existencialista. Na verdade, durante algumas décadas, no pré e pós II Guerra Mundial, a capital francesa foi um enorme laboratório filosófico onde se forjou o existencialismo, que teve a sua grande “festa” entre o final do conflito e o início da década de 1950. Nessa festa existencialista, um casal assumiu-se como mestre-de-cerimónias. Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre, omniscientes e omnipresentes, reinaram sobre a margem esquerda do Sena e conjuraram muita da mística que ainda hoje cobre o movimento.