Fugas - Viagens

  • A Depressão Danakil tem o “charme” de ser uma das mais inóspitas regiões do globo
    A Depressão Danakil tem o “charme” de ser uma das mais inóspitas regiões do globo Mark Panszky
  • Há poucos vulcões ainda em actividade: chegar à efervescente boca do Erta Vale é uma experiência inesquecível
    Há poucos vulcões ainda em actividade: chegar à efervescente boca do Erta Vale é uma experiência inesquecível Lucy Manderson
  • Há poucos vulcões ainda em actividade: chegar à efervescente boca do Erta Vale é uma experiência inesquecível
    Há poucos vulcões ainda em actividade: chegar à efervescente boca do Erta Vale é uma experiência inesquecível Rui Barbosa Batista
  • Cortar o sal
    Cortar o sal Rui Barbosa Batista
  • Cortar o sal
    Cortar o sal Rui Barbosa Batista
  • Cortar o sal
    Cortar o sal Rui Barbosa Batista
  • Sempre sob forte vigilância
    Sempre sob forte vigilância Mark Panszky
  • As crianças tratam das cabras, importante fonte de alimentação, pelo leite e pela carne. Antes dos 10 anos já são responsáveis pelo principal meio de subsistência da tribo
    As crianças tratam das cabras, importante fonte de alimentação, pelo leite e pela carne. Antes dos 10 anos já são responsáveis pelo principal meio de subsistência da tribo Rui Barbosa Batista

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Na Etiópia, um desafio extremo

Reencontramos encantadoras crianças afar. Estão por todo o lado. Surpreendente a sua beleza e exotismo. Que se degrada rápida e irreversivelmente a partir dos 20. As mulheres casam entre os 13 e os 18, com um afar. Preferencialmente primo. Os homens ligam-se a quem quiserem. Muslim rules...

Acompanham-nos. Pedem água. Uma recordação. Dinheiro. É-lhes indistinto. Têm o ar duro de todo o cenário. Há melhores sítios para ser menino/a.

Chegamos ao acampamento-base para almoço tardio. As temperaturas proíbem circular no exterior. Tentamos refrescar em cubículo redondo de rocha de lava e palha no tecto. Ajuda a serenar. Polícia e exército reforçados.

O calor esmaga – durante o dia ultrapassa regularmente os 50º - e só por insanidade arrancaríamos antes das 17h. Desnecessário engrossar a lista dos que perecem por desidratação. Continuo a ingerir uma média de sete litros de água por dia (há quem recomende um litro por hora diurna). Nem por isso urino. É tudo transpiração. Benditos toalhetes…

O relógio chega-se irresponsavelmente às 18h quando, enfim, partimos. Será subida em ziguezagueantes 10.000 metros. Na prática, teremos unicamente mais uma hora de claridade. Os frontais na testa terão de resistir a mais três e meia. E nós por sinuosos atalhos, obstaculizados por lava errante. O terreno é excessivamente irregular. Traiçoeiro. Demasiado por onde correr mal.

O simpático golpe na planta do pé direito podia vir em  altura mais conveniente. Tal como o desconforto intestinal, sem remédio por perto. Os lábios mal tratados pelo sol são mero pormenor. Excelente. O cenário tem imenso por onde melhorar. Podia pagar 30 euros e ir de camelo (carregam os mantimentos). Não seria a mesma coisa.

Um martírio que tem olhar fixo em luz avermelhada a destacar-se num negro horizonte elevado e sempre, sempre distante. É vida. É o Erta Ale, com 30 quilómetros de diâmetro na base e um quilómetro quadrado no cume, com caldeira que abraça duas crateras.

Na verdade, nenhum obstáculo é suficiente quando, finalmente, e após cruzarmos a “estaladiça” caldeira, nos deparamos com a efervescente boca do Erta Ale. Ondas de magma baloiçam como o revolto Atlântico. Uma coreografia em tons laranja enfatizados pelo negro da escuridão. Sob o mais cristalino céu estrelado. Recompensa assombrosa.

Há poucos vulcões na Terra ainda em actividade. Nenhum permite uma aproximação destas. Estou a escassas dezenas de metros do magma que tudo consome, numa piscina de agitados 60 por 100 metros. O vento chega pelas costas - inalar estes gases pode ser fatal - mas nem por isso atenua um calor que abafa.

Autismo total. Ninguém quer saber do jantar. O tempo consome-se ali. Impossível virar as costas a este fenómeno quase divino. Sem dúvida, o ponto alto da Depressão Danakil. Este lago de magma tem vida ininterrupta pelo menos desde 1967, altura em que começou a ser seguido cientificamente. É, por isso, o vulcão activo mais velho do mundo.

É a face de uma bomba-relógio. A Terra range pelo afastamento de três placas tectónicas: africana, árabe e somali. Assim, há mais espaço para o magma ser expelido. A zona mais quente do globo tem, por isso, tendência a… aquecer. Há uns anos, o chão abriu-se e engoliu tudo, durante a noite. O solo treme amiúde e os gases letais surgem em maior escala. Há cientistas que defendem que o corno de África se separará do Continente…

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