Fugas - Viagens

  • A Depressão Danakil tem o “charme” de ser uma das mais inóspitas regiões do globo
    A Depressão Danakil tem o “charme” de ser uma das mais inóspitas regiões do globo Mark Panszky
  • Há poucos vulcões ainda em actividade: chegar à efervescente boca do Erta Vale é uma experiência inesquecível
    Há poucos vulcões ainda em actividade: chegar à efervescente boca do Erta Vale é uma experiência inesquecível Lucy Manderson
  • Há poucos vulcões ainda em actividade: chegar à efervescente boca do Erta Vale é uma experiência inesquecível
    Há poucos vulcões ainda em actividade: chegar à efervescente boca do Erta Vale é uma experiência inesquecível Rui Barbosa Batista
  • Cortar o sal
    Cortar o sal Rui Barbosa Batista
  • Cortar o sal
    Cortar o sal Rui Barbosa Batista
  • Cortar o sal
    Cortar o sal Rui Barbosa Batista
  • Sempre sob forte vigilância
    Sempre sob forte vigilância Mark Panszky
  • As crianças tratam das cabras, importante fonte de alimentação, pelo leite e pela carne. Antes dos 10 anos já são responsáveis pelo principal meio de subsistência da tribo
    As crianças tratam das cabras, importante fonte de alimentação, pelo leite e pela carne. Antes dos 10 anos já são responsáveis pelo principal meio de subsistência da tribo Rui Barbosa Batista

Na Etiópia, um desafio extremo

Por Rui Barbosa Batista

Poucos lugares no mundo são tão desafiadores e estimulantes quanto a Depressão de Danakil, uma das regiões mais inacessíveis e menos exploradas da Terra. É oficialmente a zona mais quente do planeta. Tem invulgares e coloridas paisagens lunares. Zona fronteiriça palco de letais problemas entre etíopes e eritreus - há turistas sequestrados e mortos. É cenário de milenares rotas de sal. E habitada por um dos povos mais resistentes e ferozes: os afar.

As assertivas agruras da Depressão Danakil – o “charme” de ser uma das mais inóspitas regiões do globo, com temperatura média anual de impressionantes 34,4º – não afastam toda a gente. Há quem aprecie a total ausência de luxos. Não há comodidades básicas como uma cama, tecto ou uma simples casa de banho. A sombra rareia. O único luxo é precisamente não haver luxo. É dormir sob um imenso céu estrelado. É experienciar um universo bem distinto do nosso. O conforto fica à porta desta região pouco habitada e dominada pelos afar, orgulhosamente o grupo étnico mais antigo da secular Etiópia. E com costumes nada simpáticos para os estrangeiros. Este sedutor marco de África é igualmente um exigente teste às nossas capacidades. Físicas e mentais.

Povo afar

Parece um absurdo viver aqui, mas os afar estão em perfeita simbiose com o rude ambiente. São ásperos como a árida paisagem. Daí a invejável capacidade de sobrevivência – em existência precária - em lugar tão hostil. Estes habitantes do deserto pertencem a outra realidade. Exceptuando as kalashnikovs e a roupa, vivem como há 2000 anos.

Tradicionalmente, são pastores nómadas. Vivem em casas frágeis feitas em folhas de palmeira e esteiras. Que transportam em camelos.

“Produzem” as barras de sal que durante séculos serviram de moeda nas terras altas. “Três ou quatro barras bastam para comprar um bom escravo”, escreveu, no século XVI, o sacerdote português Francisco Álvares. A mineração do sal ainda é o principal modo de vida. Há dois milénios que estas agrestes paisagens contemplam as caravanas de camelos. É por aí que seguiremos.

As mulheres têm beleza exótica. Usam penteados entrançados. Brincos pesados e tornozelos adornados com peças de bronze. Cuidadosas cicatrizes no rosto - queimar ou cortar a pele – matam o mal. Dizem que curam o sangue mau. Somente isso. Tratam da “casa”. Passam o dia a buscar água, recolher lenha e cozinhar. Sem verdadeira privacidade, são permanentemente “vigiadas”. Sobretudo quando há forasteiros por perto. Independentemente do sexo.

As crianças tratam das cabras, importante fonte de alimentação, pelo leite e pela carne. Antes dos 10 anos já são responsáveis pelo principal meio de subsistência da tribo. Aqui é impossível viver sem animais. Os camelos dão transporte e leite. E resistem uma semana sem água.

Os homens são altos e esguios. Usam toga de algodão leve lançada ao ombro. Passeiam-se com punhal curvo de 40 centímetros protegido em bolsa de couro. Outros são apegados à sua kalashnikov. Uma ou outra arma, habitualmente fatais nas disputas entre clãs.

Os homens têm fama de ferocidade e xenofobia: até aos anos 30 do seculo XX era costume matar os intrusos masculinos e cortar-lhes os testículos. Como troféu. Seguimos caminho?

A preparação

A entrada para o Danakil apenas pode ser feita por dois lados: Makele, seguindo a rota das caravanas de sal, e Serdo, a sul. A primeira é mais prática. Podia fazer o circuito Makele, Berahile, Hamed Ela, Dallol, Lago Asale, Erta Ale, Lago Afrera e sair por Serdo, mas estou sem alternativa.

--%>