Fugas - Viagens

  • Rute Obadia
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  • Goran Tomas Evic/Reuters
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De Luxor a Assuão, viagem num Egipto à espera dos turistas

Depois de uma viagem na carrinha chegamos à faluca (pequena embarcação) que nos levaria ao templo de Ísis, construído na ilha de Filae durante a 30.ª dinastia, mas desmontado e reconstruído na ilha vizinha de Agilkia entre 1972 e 1980, já que, com a construção da barragem de Assuão, o complexo de templos da ilha de Filae passou a ficar submerso boa parte do ano.

Duas crianças, de sete e oito anos, guiam a nossa faluca como gente grande, sob supervisão de um adulto que só auxilia no momento de atracar o barco. Este espaço foi, tal como Abu Simbel, classificado Património Mundial pela UNESCO numa área designada Monumentos Núbios de Abu Simbel e Philae. É uma visita imperdível a um templo que foi feito para homenagear Isís — símbolo da fertilidade e maternidade e deusa adorada um pouco por todo o mundo — e onde apetece permanecer.

De volta a Assuão, numa manhã feita em fast-forward, há tempo para mais duas visitas. Primeira paragem: uma loja de perfumes que é uma verdadeira experiência sensorial, feita com toda a cerimónia, incluindo um chá ou bebida típica para acompanhar a demonstração — aqui há recriações de perfumes conhecidos, aromas locais deliciosos, há soluções para asma, enxaquecas e toda e qualquer maleita que possa imaginar. Segunda e inesquecível pausa: mercado de Assuão.

Para quem aprecia o espírito de um bom mercado — e isto significa para quem gosta de explosões de cores, de opções, de gente —, este é o lugar. Prefira a visita diurna à nocturna, que além de mais segura é a melhor para apreciar verdadeiramente o movimento.

Os mercados existem em quase todas as paragens e qualquer uma delas é interessante para recordações, mas o exotismo deste lugar não se compara a nada do que tínhamos visto. Perder-se nas especiarias, investir na shisha, sentir os aromas (e prová-los, para os aventureiros que ignorarem os conselhos de não comer fora de hotéis e lugares absolutamente recomendados), conhecer o artesanato, dialogar com os comerciantes. A experiência é quase cinematográfica e o assédio (para onde quer que olhe vai ter alguém a querer vender-lhe alguma coisa) torna-se até suportável.

Regressámos ao barco já com o fim da viagem a fazer mossa. Terminar em Assuão é uma dicotomia de sentimentos: o bom de se sair com o melhor na memória e o desejo de que tudo estivesse apenas a começar. A própria tripulação parece pressentir isso. “Está quase a terminar. É uma pena”, diz Mohamed, trabalhador do restaurante, o único da tripulação que fala um pouco de português — português do Brasil, que aprendeu com família que por lá vive. “Eu estou a esquecer a língua já, têm de vir mais portugueses cá para eu praticar. Têm de voltar vocês”, sorri.

É o mesmo desejo do capitão Qadry, a quem o coração aperta ao ver o Nilo quase vazio. “Está a melhorar aos poucos. Mas o que eu já vivi aqui...”, recorda numa conversa em árabe que Mohamed Zacarias vai traduzindo. São 63 anos de vida e quase os mesmos passados ali, no rio onde os pais já navegavam e onde Qadry anda desde miúdo, quando conduzia uma faluca. Noutros tempos chegou a fazer a viagem entre Assuão e o Cairo, separados por quase mil quilómetros. Mas depois os atentados assombraram o negócio e os turistas foram desaparecendo. “São terroristas, não são a nossa gente”, refere entristecido.

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