E se falamos em doçaria, não podemos esquecer as fatias do Freixo (Marco de Canavezes), o pão-de-ló que a esta base adiciona doce de ovos e cobre tudo com açúcar glaceado. A prova é no restaurante-bar Tongobriga (já iremos à estação arqueológica) — durante um chá, Emília Araújo conta-nos como voltou do Rio de Janeiro, depois de enviuvar, para junto da família e, mesmo sem qualquer experiência na área, decidiu apostar neste espaço. “O meu filho viu na internet. Tem natureza, arqueologia, apostei. E a localização é uma vantagem”, reconhece.
Para Teresa Ruão a localização nunca foi um problema, embora ela não o soubesse. A sua Cozinha da Terra é a sua casa de família e aqui concretizou o seu sonho de ter um restaurante. Nunca lhe tinha ocorrido fazê-lo dentro de casa, uma casa rural do século XVII, com pergaminhos que remontam ao início da nacionalidade.
Foi por influência de amigos que, aos 45 anos, depois “de fazer muitas coisas”, decidiu avançar com a sua ideia de restaurante familiar (e menu tradicional), com “o conceito de criadas”, que replicasse o que era mesmo a sua casa. “Recebíamos sempre bem, muita gente.” Entretanto, abriu também alojamento, nas instalações dos caseiros, onde a pedra e a madeira são rosto e alma de uma rusticidade ancestral à flor da pele.
Uma experiência gastronómica distinta é a que temos no restaurante Largo do Paço (Hotel da Casa da Calçada), com um menu de degustação cortesia do chef Vítor Matos que vale uma estrela Michelin e a reputação nacional e internacional. Ainda em Amarante, sem reputação internacional mas internacional de nascença, A Eira é o projecto de um casal luso-galego, com menu a condizer. Por amor, José Manuel Diaz instalou-se aqui e aqui desenvolve a sua actividade na área do turismo.
O futuro no passado
Talvez seja o turismo que justifica a existência de um wine bar em Quintadona – aldeia de xisto em território de granito, recuperada e cenário de ruralidade quase idílica — mas não é ele que mantém Os ComoDEantes, uma associação teatral que em Novembro apresentou a peça Rei Lear, de Shakespeare, para os Palcos do Românico. Porque a RR está a ensaiar uma dinâmica cultural para cobrir os seus 12 municípios, por forma a valorizar também o património imaterial (música, danças, lendas, contos) e, sempre que possível, utilizando o património edificado como cenário.
Imaginar é fácil quando estamos em Tongobriga: como seria apresentar aqui uma das peças “romanas” de Shakespeare? Afinal, estamos em cidade romana — e aldeia portuguesa, Freixo (Marco de Canavezes). Não é um pormenor, já que andamos entre o cruzamento da história. Pela aldeia vislumbram-se os restos da cidade, para além do perímetro da Estação Arqueológica do Freixo (50 hectares), escavados e expostos para mostrar o antes e o depois. E que destino mais apropriado para a antiga Tongobriga do que albergar uma Escola Profissional de Arqueologia?
Muitos dos edifícios do centro da aldeia, na Rua da Igreja, Rua dos Judeus, casinhas de pedra, portas e janelas de madeira coloridas são salas de aula, bar, secretaria… Antes eram lojas, de judeus, certamente, os chamados “judeus de Bragança”, que deixaram a tradição da Feira da Quaresma. Quem nos vai contando tudo isto é Luís Correia, 35 anos e fascinado pelas ruínas desde os “seis ou sete”. “Vi isto num domingo à tarde”, recorda, num passeio de família. Veio para aqui estudar, “no único ano em que não abriu o curso de assistente de arqueólogo”. “Então fui para técnico [de Recuperação do Património Edificado].”