Se o antigo armazém cativou logo pela beleza exterior, o interior foi uma “surpresa”, pelas madeiras — os adjectivos abundam: “lindíssimas, fabulosas”. A intervenção foi realizada para potenciar o que foi encontrado e não podia ser de outra forma: primeiro pela obrigação de manter a integridade da fachada, por exemplo, depois pelo próprio desejo dos proprietários. Assim, a madeira é omnipresente nos dois andares (em mezanino) do Castas e Pratos, na estrutura e no mobiliário, e as cores não fogem a essas tonalidades. O resultado é irremediavelmente contemporâneo, discreto por opção e confortável por inevitabilidade. O rés-do-chão é dedicado à garrafeira que se alinha por detrás de armários com portas de “rede” de metal e ao bar — algures entre wine bar e tapas bar — que se exibe numa série de mesas altas dispostas juntas como se de um grande balcão se tratasse (acompanhado de cadeiras a condizer) a promover a convivialidade; o primeiro andar é reservado ao restaurante e, na parede do fundo, a fotografia de carris que a ocupa transmite sempre a ideia de viagem. Que está, afinal, no ADN de um espaço ligado aos comboios. A.M.P.
Castas e Pratos, Rua José Vasques Osório. 5050-280 Peso da Régua. Tel.: 254 323 290. GPS: 41° 9’ 27.98; 7° 46’ 59.857. www.castasepratos.com
Vila Real: Restaurante Cais da Villa
Quando o Cais da Villa foi inaugurado ainda se falava do regresso à vida da estação ferroviária de Vila Real. Estávamos em Novembro de 2010, o troço entre Vila Real e Peso da Régua da Linha do Corgo tinha sido encerrado no ano anterior para a realização de obras, mas havia datas previstas para a sua reabertura: não a da Secretaria de Estado dos Transportes, que havia indicado o final de 2010, mas a da Refer, 2011, ainda podia encaixar-se nesse plano. “A nossa intenção [ao abrir o restaurante] era receber os turistas que vinham da Régua, do Douro”, explica José Ferreira, gerente do Cais da Villa, propriedade de Horácio Negrão. “Mas acabaram por tirar as linhas. Aí soubemos que não ia haver comboios. Se as tiravam não iam recolocar.”
Foi um balde de água fria, percebe-se pelas suas palavras. “Tivemos que repensar a nossa estratégia de posicionamento de mercado”, nota, “porque enfrentámos dois tipos de problemas”. Um é “a falta de hotéis de cinco estrelas em Vila Real”, o público pretendido, o outro é “a falta de turismo”, diz. “Só com habitantes de Vila Real um restaurante como o nosso não consegue sobreviver.”
O Cais da Villa foi instalado num antigo armazém da estação ferroviária de Vila Real, inaugurada em 1906. Um dos fundadores foi Edgar Gouveia (que entretanto deixou o restaurante), que já tinha experiência noutro restaurante no mesmo entorno (o Castas e Pratos, na Régua), e a ideia era replicar o conceito em Vila Real. Um espaço que fosse “igualmente emblemático”, instalado “num edifício com história na cidade”. “Estes edifícios ferroviários dizem sempre algo às pessoas”, afirma, “e há um interesse notório”. “Mérito também da nossa reabilitação.”
A ideia de manter a traça do edifício e criar um espaço ousado foi concretizada, considera. Destaca-se no antigo conjunto ferroviário branco o edifício pintado de castanho-chocolate, debruado a pedra nas esquinas e a rodear as janelas, com telhado inclinado suportado por vigas de madeira — parece quase uma peça colocada à parte, a coroar o volume. Há repas de madeira numa das fachadas, um acrescento aproveitando o beiral grande, e a rodear a esplanada — um toque de modernidade circunspecta, que acrescenta conforto. No interior, as paredes em pedra despida, irregular, foram mantidas como testemunho de uma história que não se quer esquecer, antes valorizar; e uma evocação de linhas férreas na zona que divide a sala de jantar do wine bar. A decoração condiz com a sobriedade da estrutura, com intromissões de ferro e iluminação cuidada, apostada em criar recantos. Porque a divisão básica é simples: de um lado, wine bar, com dois grandes balcões à laia de mesas comunais e caixas de madeira como estantes-expositoras de vinho; do outro, restaurante, o branco mais presente no mobiliário e nas formas bizarras que são como biombos indisciplinados (e sobressai a garrafeira, “caixa” transparente). E no wine bar encontramos 613 referências de vinhos (sem surpresas, maioria do Douro) para acompanhar (ou não) tapas; no restaurante, “cozinha tradicional de autor, pratos que reflectem a cozinha duriense e transmontana”, servida à carta mas também em menus executivos e de grupo.