Podia não ser a rua principal da cidade velha, mas teria algo de simbólico para os Reis Católicos: no Palácio de los Golfines de Abajo ficaram alojados na suas estadias em Cáceres (por isso, o seu escudo preenche a fachada) e na Plaza de San Pablo situa-se o Palácio das Cegonhas, o único que pôde manter as ameias na sua torre, mercê da lealdade dos proprietários para com a causa de Isabel – ironicamente, as cegonhas parecem agora preferir a torre da vizinha igreja de San Mateo para nidificar.
Velhos e novos mestres
Estamos na parte mais elevada de Cáceres, três praças que se sucedem onde antes se ergueu o antigo alcázar árabe. Há vista para os campos para além da cidade desde a Plaza de las Veletas, onde o palácio homónimo é agora Museu Provincial, a história revista em peças arqueológicas, em cujas fundações se encontra a cisterna do álcazar, colunas e grandes arcos perfeitos no que poderia ser um salão. A saída do museu guarda o inesperado: um núcleo de arte contemporânea, já noutro palácio mas ligado ao primeiro, com obras de Picasso, Miró e Tàpies, entre outros.
Antes já havíamos visitado a Fundação Mercedes Calles e Carlos Ballestero, ela cacerenha que deixou parte considerável do seu património à cidade para ser colocado ao serviço da cultura. É assim que no palácio dos Becerra nos deparamos com obras de Van Dyck e Rubens, parte de uma das exposições temporárias que constituem o principal foco da fundação (Rembrandt, Zurbarán ou Warhol, por exemplo, já passaram por aqui), que tem um núcleo permanente com objectos da mecenas, como mobiliário, jóias ou porcelanas.
No seu esforço de dinamizar a cidade antiga, a fundação abriu já este ano, na mesma Plaza de San Jorge onde se encontra, a cafetaria El Jardín de Ulloa, num espaço antes dividido por várias lojas de artesanato (resta uma). Com paredes de vidro para a praça, onde instalou uma elegante esplanada, um dos méritos da cafetaria foi o de dar visibilidade aos jardins que lhe emprestam nome e que antes estavam escondidos por muros altos – e assim entramos nas traseiras da Cáceres antiga. E na órbita deste jardim, uma galeria de arte e cafetaria, Los Siete Jardines, homenageia também esses espaços invisíveis destas paragens pétreas.
Mas se Cáceres se está a afirmar como centro de arte contemporânea a culpa é principalmente de uma galerista de origem alemã, Helga de Alvear, proprietária de uma das mais importantes (e maior: 2000 peças) colecções de arte contemporânea da Europa. Estamos fora das muralhas mas quase ao lado, na Calle Pizarro, onde os bares se sucedem (não podemos esquecer que Cáceres é cidade universitária) e a Estación de Arte Acción se intromete. Maior intromissão é, porém, a do Centro de Artes Visuales Fundación Helga de Alvear, que transformou um edifício modernista em museu moderno com a assinatura dos arquitectos Emilio Tuñón e Luis Moreno Mansilla, vencedores do Prémio Mies van der Rohe em 2007.
Agora em obras de ampliação, o museu continua a funcionar com as suas exposições temporárias (agora Y el tiempo se hizo, colectiva onde se reflecte sobre a concepção do tempo, e Monumento máquina, do catalão Jorge Ribalta) que fornecem perspectivas diferentes do acervo da galerista que abraça diversas disciplinas das artes visuais contemporâneas.