Fugas - Viagens

Continuação: página 2 de 8

Viagem através da memória por uma Suécia que já não existe

- Mal entrávamos em Skansen, recordo-me de que seguíamos pela esquerda e, logo à direita, encontrava os macacos, não muito longe do aquário. Na minha mente, tantos anos depois, era como se aquele fosse o nosso passeio tradicional, sem qualquer quebra de rotina, à volta do museu.

 

Os tempos dos statare

Skansen, qual miniatura da Suécia, ocupa uma área ondulada de cerca de 30 hectares na ilha de Djurgården e materializa, com inegável sucesso, o objectivo de Artur Hazelius de mostrar cada meio ambiente, o rigor de edifícios históricos, os costumes da época e as paisagens naturais que incluem animais. Mas também uma vivência feita de dificuldades num país que já não existe a não ser nas ruas e vielas de um museu ao ar livre que é uma autêntica viagem ao passado.

- Noventa e nove por cento das casas que preenchem a área ocupada por Skansen foram trazidas de diferentes zonas da Suécia. Nesta, ainda em uso na década de 1960 e proveniente, oito anos mais tarde, de Berga, em Södermanland, viviam duas famílias muito pobres que trabalhavam nas quintas, cultivando as terras e tomando conta dos animais e, em troca, recebiam comida e muito pouco dinheiro, evoca Els-Marie Ahlstrand, em Skansen desde 1986 e agora sentada à porta da Statarlängan, tricotando, com as suas roupas tradicionais, um lenço à cabeça e uns óculos que não escondem um sorriso genuíno.

A Statarlängan contém, na verdade, duas divisões que retratam, com elevado rigor, como era a vida de duas famílias com grandes carências na década de 1920. O edifício, conhecido como Snickartorp, data, provavelmente, de inícios do século XIX e o último trabalhador a ocupá-lo (a ala esquerda) foi Erik Wilhelm Carlsson, que para aqui se mudou, com a sua mulher, Kristina Charlotta, em 1874, permanecendo na casa ao longo de 50 anos.

- Estabelecia-se um contrato de arrendamento com uma família que se prolongava por um ano, desde o primeiro dia de Novembro até ao último de Outubro. Na última semana — e apenas na última — os trabalhadores podiam tomar uma decisão e, se fosse esse o seu desejo, eram livres de partir à procura de melhores condições de vida; caso contrário estavam obrigados a permanecer no lugar por mais um ano, conta ainda Els-Marie Ahlstrand, agora na companhia de Mia Terent, em Skansen desde 1997, quando ainda era estudante.

O sistema agrícola foi introduzido no país em meados do século XVIII e generalizou-se ao longo do século XIX (um total de 100 mil agricultores e meio milhão se contabilizadas as famílias no final do século XIX), consistindo em empregar, em grandes quintas, trabalhadores que não possuíam terras para cultivar. Na Suécia, estes agricultores eram designados statare, em virtude de receberem principalmente em géneros (stat), tais como cereais, leite, ervilhas secas e arenque salgado — sempre a mesma quantidade, fosse uma família constituída por dez ou 20 membros, com excepções pontuais: a incapacidade de escoamento (venda ou utilização própria) dos produtos ou, mais tarde, como esforço para prevenir uma eventual partida dos trabalhadores para as zonas industriais em grande expansão. Os homens tinham forçosamente de ser casados e as mulheres, na época numa posição muito próxima da escravidão, eram obrigadas a trabalhar, a maior parte das vezes na ordenha e na produção de leite e seus derivados — e o sistema, que potenciava as miseráveis condições e a exploração da comunidade rural, apenas foi abolido em 1945.

--%>