Fugas - Viagens

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Viagem através da memória por uma Suécia que já não existe

Devolvo o olhar ao jardim e deixo-o acompanhar pelos passos, como se o odor fosse um magnetismo: é o jardim das rosas de Skansen, geometricamente perfeito, com os seus 16 quadrados, e muito próximo, sobranceiro à Porta de Hazelius, a esplanada do Rei Oscar, por onde me apetece ficar por longos minutos, embrenhado em silêncio e na lembrança das lembranças de Terese Jonsby.

- Memórias de observar as focas, como eu gostava delas – e elas estavam sempre lá, parecendo tão felizes. Essa era, sem dúvida, uma das minhas paragens preferidas, era capaz de ficar ali uma eternidade, a admirá-las, a observar os seus movimentos delicados e tão elegantes. Mas também me lembro, como se fosse hoje, de uma cabra na qual depositava sempre o meu olhar porque era a minha preferida.

A chuva faz uma pausa.

- No Verão, podia ser um pavão, simplesmente passando, indiferente ao mundo que o rodeava — e que fascínio exercia sobre mim. É curioso: as imagens que eu tenho de Skansen são influenciadas pelas estações do ano, tão distintos eram os eventos. Quase sempre com a minha avó, por vezes visitava Skansen no Natal, outras para celebrar o Midsummer. E, nesta ou naquela altura do ano, o lugar produzia em mim um encanto que nunca se irá apagar da minha memória.

O tunnbröd e Slegora

O parque zoológico de Skansen é diversificado e representa as espécies escandinavas, passeando-se por diferentes áreas do museu. Num lado, os animais que no passado se viam nas quintas, as galinhas, os porcos de Linderöd, gansos, patos, cavalos, vacas, ovelhas e cabras; no outro, o urso pardo, que pode pesar até 350 quilos; mais além, o lobo, depois o lince, o único felino selvagem da Suécia, também o glutão, o personagem mutante de X-Men, maior mustelídeo da Suécia (pode pesar até 30 quilos) e uma espécie protegida no país (não existem mais de uma centena de exemplares); e há o alce, o rei dos bosques da Suécia e o maior mamífero (chega a atingir os 700 quilos), uma espécie em vias de extinção durante o século XVIII mas hoje recuperada, e a rena, desde tempos imemoriais o gado dos sami — em Skansen há um lugar que mostra como vivia este povo indígena no Norte da Suécia. E a foca cinzenta, tão do agrado de Terese Jonsby na sua meninice, a maior de todas quantas se podem encontrar nas águas escandinavas (mar Báltico e golfo de Botnia), com um comprimento de três metros e um peso de 300 quilos.

- Mas o que eu gostava mesmo era da sensação de caminhar com a minha avó, seguindo uma rota ou simplesmente ao acaso, sem pressa, rodeada da natureza e de animais num lugar com uma panorâmica fascinante sobre Estocolmo.

Quando a recordação destas palavras se desvanece, o sol brilha timidamente, levanto-me e caminho de volta ao jardim. Uma mulher e dois homens, todos de nacionalidade iraniana, vão tirando fotografias uns aos outros, às rosas cujo perfume preenche o meu olfacto, às estátuas que se perfilam e exacerbam a beleza e a tranquilidade do lugar.

Não tardo a entrar numa outra casa de onde acabam de sair duas mulheres espanholas; dois ou três turistas permanecem no interior, indiferentes à minha chegada e de olhos plantados no rolo de massa de Annika Jonsson, há cinco anos a trabalhar em Skansen, há outros tantos a confeccionar o tunnbröd, o pão fino (ou chato) sueco que, uma vez seco, se pode guardar por muito tempo. Considerado um alimento de climas frios e de gente pobre, o tunnbröd é preparado à base de mistura de vários cereais, sal, açúcar e fermento e, desde que se deseje, com sementes aromáticas, sendo depois levado ao forno, como faz neste preciso momento Annika Jonsson.

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