A estrada sobe, sobe, em ziguezague, apela ao esforço do motor, a panorâmica é deslumbrante, vestida de verde e de pedra. As nuvens mancham o céu de cobre e insinuam-se por entre os pinheiros, o vento sopra com mais força e, ao fim de algum tempo, como se de uma recompensa se tratasse, o Parque Nacional Llogaraja, território privilegiado de veados, javalis e lobos, exibe-se em toda a sua generosidade. O pico, com 1025 metros, começa a ficar para trás, nos vales, pastores e rebanhos, perdidos no horizonte, semelham-se a formigas, a estrada é uma serpente que vai rastejando, para a frente e para trás, e o sol espreita por entre a cortina, pincelando o mar de múltiplas tonalidades.
Dhërmi, pequeno para tantos italianos nos meses de Verão – e albaneses aos fins-de-semana – recebe-me ao crepúsculo. Alugo um quarto numa casa e passo as primeiras horas da noite numa taberna, servido por um casal grego simpático que me convida a beber raki depois de um delicioso jantar.
Aos poucos, a vida enche-se de silêncio e o céu de estrelas.
Sucessão de praias
Aos primeiros alvores de um dia que promete sol e calor, já estou na estrada. As praias, línguas de areia beijando águas cristalinas, sucedem-se: de Dymades, próxima de Dhërmi, avança-se para a encantadora Gjipe, desta para Jale e logo, ainda e sempre à boleia, abordo a antiga de Himara, velhinha com mais de três mil anos mas conservando muitos dos traços da sua fundação. Em tempos de antanho, foi habitada pela tribo grega dos caónios, uma das três principais do Epiro, e nos dias de hoje, quando se deambula pelas suas ruelas de pedra e de casas caiadas de branco, algumas com bandeiras gregas que brincam com o vento, o silêncio e a nostalgia impregnam-se na alma do viajante. Em 1990, a maior parte dos habitantes de etnia grega abandonou Himara mas actualmente assiste-se a um regresso – e o grego volta a ser a língua mais escutada na pequena povoação dominada pelo castelo e por duas igrejas, uma delas, a de Todos os Santos, com os seus ícones ortodoxos prateados, os seus frescos e as suas paredes agora cinzentas do fumo de cerimónias religiosas de tantos séculos.
Avisto um pastor vagueando por sobre as ruínas no lombo da colina que domina o Golfo de Spille; uma cabra, num equilíbrio precário, olha-me desconfiada mas logo vira a cabeça noutra direcção – e como eu a compreendo a sua repentina indiferença. Ao fundo, no final de um vale cultivado, mostra-se a bonita praia de Livadhi e, mais para lá, até ao horizonte longínquo, as águas calmas do mar sulcado por cargueiros solitários.
A Albânia, com 427 quilómetros de costa, não deixa de se revelar uma surpresa a cada curva – entre duas boleias e muitos mais quilómetros a pé, tanto se deseja absorver a beleza infinita das montanhas como a das praias. Até atingir Lukovë, visito o Castelo de Porto Palermo – alegadamente construído por venezianos -, na baía do mesmo nome; mais para norte, avisto um bunker submarino (numa área militar restrita) e, às primeiras horas da tarde, Sarandë recebe-me com um frémito de vida que jamais conhecera ao longo da minha jornada pela riviera albanesa.