Daqui se depreende que a soberana não pode, para sermos justos, garantir o exclusivo dessa viragem histórica, exacerbando Bath como cidade da moda. Ralph Allen e o já citado Richard “Beau” Nash, um dandy, colocaram a cidade nos píncaros da fama, atraindo a sociedade que não se contenta com pouco e não se satisfaz com muito. Ralph Allen desenvolveu um esforço notável para tornar rentáveis as pedreiras de Coombe Down, construiu o Prior Park (a menos de dois quilómetros, para sul, do centro da cidade) e concedeu emprego e liberdade aos dois John Wood para criarem alguns dos mais proeminentes edifícios de Bath.
Ao mais velho, entre outras construções, como o St. John’s Hospital, Queen Square, Royal Mineral Water Hospital, North e South Parades, fica a dever-se o Circus, um anel de 30 casas simétricas divididas por três terraços onde viveram, em diferentes épocas (conforme se pode ler em placas afixadas nas fachadas), famosos como Thomas Gainsborough, o major-general Robert Clive, também conhecido como Clive da Índia (inspirou um filme em 1935 com título homónimo e realizado por Richard Boleslawski) e David Livingstone.
Ao mais novo dos Wood, o edifício mais glorioso de todos, uma meia-lua que permanece como um dos melhores exemplos da arte da arquitectura, o Royal Crescent, onde agora me sento, aquecido pelos raios tépidos do sol, ora observando o terraço semicircular de casas majestosas, ora esta eternidade de espaço (relva) que se perfila à minha frente, onde jovens casais se entregam ao amor com a mesma paixão com que John Wood se dedicava à arquitectura.
Construído entre 1767 e 1775 (sete anos antes da morte do homem que o desenhou), o Royal Crescent era um território ocupado, nesses finais do século XVIII, pela alta sociedade, alugando as casas com vista para o verdejante Royal Victoria Park.
Bath rivalizava, por essa altura, com Londres, com invernos cheios de entretenimento que tanto seduziam a população da capital, atraída pelos ecos que chegavam desse primeiro resort de frivolidade e moda. Com as suas salas de jogos, Bath estava para o século XVIII como Las Vegas está para o século XXI. E Bath continuou a prosperar, atraindo monarcas e aristocratas, escritores, actores, jogadores de râguebi (a equipa local é uma das mais fortes em todo o país), futebolistas e estrelas de Hollywood, tantos famosos que se misturavam com turistas anónimos.
Mais famosa é a relação que Bath sempre teve com escritores. O escocês Tobias Smollett, tão apreciado por Charles Dickens, como admite em David Copperfield, viveu durante uns tempos na cidade; o próprio Dickens visitou Bath em diversas ocasiões, na qualidade de repórter parlamentar ou apenas para rever um dos seus melhores amigos, Walter Savage Landor, no número 35 da St. James Square (onde se pode ver uma placa em bronze imortalizando o momento), sem esquecer que, em Os Cadernos de Pickwick, a vida de Bath é satirizada pelo grande escritor (Dowler e Winkle envolvem-se numa perseguição hilariante à volta do Royal Crescent); Henry Fielding, autor de Tom Jones, residiu em Twerton, um subúrbio de Bath, onde terá escrito pelo menos uma parte da sua famosa novela antes de viajar, na companhia da mulher, para Lisboa — e na capital portuguesa, com apenas 47 anos e dois meses após ter desembarcado, veio a falecer.