A história de Siegen é indissociável desta dinastia, que daqui estendeu a sua influência e hoje reina na Holanda e Luxemburgo. A reforma religiosa dividiu-a em ramo católico e ramo protestante, cada qual com o seu castelo na cidade: o “superior” (pela localização), o “original”, permaneceu no ramo católico, o “inferior” foi construído para o protestante. Deixou marcas, este conflito religioso, numa cidade onde o calvinismo rigoroso, dominante, a manteve à margem de certos “prazeres terrenos”, como o teatro, por exemplo — conta Birgitte que apenas no final do século XX apareceram salas de teatro aqui. Ao mesmo tempo, exaltam-se histórias como a do guarda da igreja e dos seus sete filhos que, vivendo na torre, carregavam água até ao cimo, várias vezes ao dia, em pleno século XX. A austeridade ainda é, portanto, ainda uma virtude numa cidade que, apesar do protestantismo que lhe moldou o carácter, alberga no seu seio várias confissões religiosas. E onde se proclama orgulhosamente que se preparam para receber 400 refugiados.
O ferro como ouro
Regressamos ao castelo superior, passando a entrada onde a grossura das muralhas é bem visível. Entramos para nos depararmos com o cartaz de uma konzert matiné, Bonjour a France que revela uma das vocações deste espaço — a cultural: entre Abril e Setembro, por exemplo, os domingos são dias de concertos gratuitos numa tenda montada no jardim. O edifício principal é o típico castelo residencial (com portadas pintadas de azul e laranja, as cores da Casa de Nassau) e hoje, além da galeria de Rubens, alberga uma galeria com retratos dos condes de Nassau, outra dedicada ao trabalho do ferro pelos celtas (incluindo uma fornalha) e uma cozinha típica destas terras. Os jardins formais estendem-se nas traseiras e dos lados, sendo cenário predilecto para sessões fotográficas de casamentos, como aquela a que assistimos, noiva vestida de azul. Há árvores exóticas e há sobretudo flores (incluindo as seis mil tulipas que todas as primaveras chegam da Holanda) — mas não em Outubro, quando tudo se prepara para a hibernação e até o canteiro das aromáticas se apresenta renitente. Duas torres sobreviventes da antiga muralha da cidade apresentam-se como miradouros privilegiados (e uma delas é testemunho do período da caça às bruxas, com um buraco profundo onde eram aprisionadas as suspeitas de práticas satânicas, em escuridão total). Contudo, todo o jardim é um terraço sobre a cidade “nova”, o subúrbio Kaan-Marienborn, e as montanhas em redor que confluem no chamado “vale da siderurgia”: daqui vem a riqueza e aqui está o motivo por que o fogo chegou pelos céus. Pela linha ferroviária, construída em 1869 para escoar o ferro, passava a matéria-prima, o ferro, que ajudava a alimentar a máquina de guerra do III Reich.
A mineração de ferro foi actividade constante ao longo de mais de dois mil anos e muitos nomes da região registam essa história. Também as minas são testemunho dessa fonte de rendimento e tiveram utilizações menos ortodoxas: serviram de abrigos anti-aéreos durante a II Guerra Mundial e foram esconderijo das obras de Rubens. O fecho das minas no rescaldo da guerra e da grande mudança estrutural do país não impediu que florescesse a indústria metalúrgica com tentáculos em todo o mundo, nota Birgitte: “Por onde viajamos, caminhamos sobre tubos que vêm de Siegerland. No mar Cáspio, por exemplo, o material do pipeline é daqui.”