Subindo pela Dongfeng Lu acabamos por desaguar no Parque Cuihu, o Parque do Lago Verde, um conjunto de jardins, lagos e pavilhões e provido, até, de uma floresta de bambu onde prosperam dezenas de espécies diferentes. O sítio não vale apenas pela aliança de natureza e cultura num complexo de jardins tradicionais chineses. Aí podemos presenciar outros dos ritmos quotidianos desta grei que vive com sol quase todo o ano e que tem o hábito de andar a passear, amiúde, de sombrinha. Ao fim da tarde, sobretudo, plantam-se nos jardins exercitações de tai-chi; e, como em certas esquinas da cidade, põe-se a gente a bailar, ora músicas de salão, ora, e em absoluta maioria, ritmos folclóricos, que usam ser nestas bandas de estilos muito sarapintados, como ficamos a saber depois de umas poucas andanças. Não raro, o que desta sorte se nos põe diante do olhar, bem vistas as danças, é a diversidade cultural e étnica do Yunnan.
Junto de um pavilhão do parque, onde duas adolescentes se fazem fotografar debaixo de sombrinhas coloridas, respiramos com incredulidade a leveza do ar e, entre dois suspiros, atravessamos uma ponte em arco. Caminhamos depois entre canteiros de flores vermelhas e amarelas por uma alameda coberta de sombrinhas de papel e balões, enfeites de eleição das festas de Primavera. O cenário para além das ramagens dos chorões que caem sobre a água não é o das montanhas nevadas que se avistam do iconográfico lago do Dragão Negro, em Lijiang, quando se vai a caminho de Shangri-La (a antiga Zhongdián, antes do livro de James Hilton, Lost Horizon, e do turismo) e do Tibete. Aqui entrevemos alguns arranha-céus. Mas fica-nos esta convicção, à vista da decoração floral que se nos mete pelos olhos dentro, de que Kunming ainda acredita em flores, e talvez não apenas pelo venal cálculo dos yuans, se vivas forem paixões como a do poeta Wang Wei, amante de recolhimentos serranos e de vistas pintalgadas por tintas primaveris: “O rio, um horizonte de pessegueiros, / a brisa da noite fez desabrochar as flores. / As cores diluíram-se pelos pomares, / as árvores como ondas verdes em fogo”.
Literatura à parte, o clima pesa. Os ares temperados de uma boa parte do Yunnan, à excepção do Noroeste, onde se começam a desenhar as raízes orientais dos Himalaias, são propícios a estas exuberâncias florais. Yunnan significa “A sul das nuvens” o que sugere a natureza soalheira da região, em comparação com a vizinha província nortenha de Sichuan. A glosa de uma eterna Primavera, muito trauteada na propaganda turística de Kunming, não é fruto de nenhuma fantasia de malabaristas de marketing. Este pedaço do Yunnan tem uma altitude média de dois mil metros, os ares conservam-se tépidos praticamente todo o ano e muitas paisagens apresentam-se copiosas no que toca a tonalidades primaveris.
Deixamos agora o Parque do Lago Verde, que fica numa zona francamente pacata, com ruas estreitas e buganvílias a espreitar por cima dos muros, num quarteirão residencial que hospeda também um punhado de guesthouses e bons hotéis muito procurados pelos viajantes. O passo seguinte é atravessar uma avenida bem movimentada, para seguirmos em direcção ao Templo de Yuantong, o mais importante santuário budista do Yunnan. Fundado há cerca de mil e duzentos anos, durante a brilhante e cosmopolita dinastia Tang, é um dos mais interessantes edifícios religiosos de Kunming, com as suas preciosas pinturas em madeira e a atmosfera ímpar de um lugar de peregrinação e de estudo.