A cantina tem janelões abertos para o céu azul e fechados com cortinas black-out para não perturbar o céu estrelado. É então que se acendem os candeeiros de tecto Lorosae desenhados por Álvaro Siza. Aqui funcionários e visitantes de várias 15 nacionalidades comem uma de três refeições – pequeno-almoço, almoço, jantar – de acordo com o seu turno. E embora a gastronomia seja internacional, ao domingo há sempre asado, o tradicional churrasco chileno.
O trabalho
Dentro do centro de controlo do VLT conversamos com o belga Alain Smette, coordenador de turno dos astrónomos e engenheiros. A sua função no VLT, onde trabalha há 12 anos, é coordenar o tempo de telescópio para cada astrónomo. Esta tarefa delicada começa com o concurso para tempos de telescópio lançado pelo ESO duas vezes por ano. Em princípio, diz ele, “qualquer pessoa pode enviar uma proposta” quer seja um astrofísico catedrático, um PI (Principal Investigator, termo bem conhecido da comunidade científica), um estudante de doutoramento ou um astrónomo amador. Ou até um artista. Porém, a fasquia académica é alta, a concorrência é feroz e o nível de investimento envolvido é enorme: cada segundo de tempo de telescópio tem o custo estimado de 2 euros. “Combinando todos os seus telescópios, o ESO recebe 900 propostas”, diz Smette, sendo atribuídas àquelas seleccionadas tempo de observação em modo de serviço e de visitante.
No modo de serviço, que corresponde actualmente a 60% da utilização do VLT, é atribuído tempo de telescópio de acordo com as especificações de cada astrónomo. A seguir as imagens e outros dados são enviados para o seu instituto de investigação usando o cabo de fibra óptica que liga o observatório directamente à sede do ESO na Alemanha.
O modo de visitante é mais dispendioso, já que envolve a vinda do investigador, ficando viagem e alojamento (três/quatro noites) a cargo do ESO. Para Smette, este modo permite uma observação “fora do padrão de uso” e “uma relação imediata com o que se está a ver”, além de uma maior interacção entre cientistas e operadores. Mas, por trazer aqui mais cientistas, este modo valoriza o VLT ao torná-lo num remoto, porém estimulante, ponto de encontro e discussão de ideias, hipóteses, teorias – e descobertas.
Toda a informação obtida nos telescópios do ESO pertence ao respectivo investigador apenas por um ano; a seguir os dados são tornados públicos e acessíveis a qualquer membro da comunidade científica – na verdade, qualquer pessoa. Actualmente, o conhecimento obtido no ESO gera em média três artigos publicados em revistas científicas com arbitragem científica por dia. Este é o observatório cientificamente mais produtivo do planeta.
Muito desse conhecimento é obtido graças aos instrumentos que vão sendo adicionados aos telescópios, exemplos de aplicação de tecnologia de ponta desenvolvida entre a universidade e a indústria. Exemplo disso é o instrumento ESPRESSO (Echelle SPectrograph for Rocky Exoplanet and Stable Spectroscopic Observations), desenvolvido por um consórcio luso-hispano-italo-suíço. De acordo com o site do ESO, este instrumento, que vai captar informação dos quatro UT, não só é “um dos instrumentos mais antecipados pelo mundo astronómico” como “vai levar a procura de planetas extrassolares ao próximo nível”.