“Se vais ao Chile tens de ir ao Paranal.” Este foi desafio que o astrónomo português Pedro Russo me fez em Lisboa semanas antes da minha partida para Santiago do Chile. Apesar de ter corrido o mundo como um dos profissionais mais destacados na comunicação de ciência e das ciências espaciais, ele ainda não foi ao maior e mais avançado telescópio do planeta. Mesmo quando em 2009 desempenhou o cargo de coordenador geral do Ano Internacional da Astronomia a partir do seu gabinete na sede do Observatório Europeu do Sul, mais conhecido pela sua sigla em inglês ESO (European Southern Observatory), em Garching, perto de Munique. Mas eu, estando semanas depois (mais) perto e sendo (um mesmo que ocasional) jornalista, poderia solicitar ao ESO uma visita e mesmo uma estada na residência do complexo. O primeiro contacto foi dele. As diligências necessárias para lá chegar e ficar uma noite foram minhas.
Muito a Sul da Europa
O ESO é uma organização europeia intergovernamental fundada em 1962 que actualmente conta com 15 estados-membros: 14 estados europeus (Portugal aderiu em 2001) e o Brasil. A sua missão passa por financiar, construir e operar telescópios e outros instrumentos de observação astronómica, colocando-os ao serviço da comunidade científica mundial.
Graças às condições únicas de altitude, precipitação, humidade relativa, turbulência atmosférica e poluição luminosa do deserto do Atacama, mas também a factores de ordem política, científica e económica, o Chile foi eleito como a nação anfitriã dos três observatórios hoje operados pelo ESO: La Silla, ALMA e Paranal.
Inaugurado em 1969, o Observatório de La Silla foi o primeiro construído pelo ESO no topo de uma montanha de 2400 metros na extremidade sul do deserto do Atacama, a 600 quilómetros a norte de Santiago. Conta com dois telescópios operados pelo ESO e oito telescópios nacionais.
O telescópio ALMA, tal como indica o seu nome em inglês – Atacama Large Millimeter/submillimeter Array – observa o universo em comprimentos de onda milimétricos e submilimétricos. As suas 66 antenas de alta precisão, instaladas no planalto de Chajnantor a 5000 metros de altitude e 50 quilómetros a leste de San Pedro de Atacama, no extremo nordeste do Chile, produzem imagens do espaço com uma nitidez dez vezes superior à do telescópio espacial Hubble.
VLT, ou Very Large Telescope — em português, telescópio muito grande — é o nome dado pela comunidade científica à principal estrutura do ESO construída a partir da década de 1990 no Cerro Paranal, a 1200 quilómetros a norte de Santiago do Chile. Trabalhar no Paranal é o sonho maior de muitos astrónomos e astrofísicos.
Não é, porém, necessário ser cientista ou lá trabalhar para conhecer estas estruturas. De forma a promover a investigação feita pelas suas equipas, mas sobretudo para estimular a imaginação do público em geral sobre o universo o ESO, permite visitas aos seus longínquos pontos de observação do desconhecido.
É que não são só as imagens de galáxias, estrelas e outros objectos espaciais registadas por estas estruturas e divulgadas pelo ESO que nos fascinam. As próprias imagens dos seus instrumentos científicos e edifícios, pousados nesta paisagem montanhosa e como que coberta de cacau em pó, fazem com que queiramos ver o que está infinitamente longe e eles nos revelam. Mas também nos convidam a chegar, um dia, a um destes sólidos geométricos entre a máquina e o edifício, o armazém e a nave espacial.