Fugas - Viagens

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Em Odessa, rir ainda é o melhor remédio

No cimo das escadas, ao lado da estátua do Duque de Richelieu, o primeiro governador de Odessa, os músicos de uma banda, todos vestidos de vermelho, tocam para quem os quer ouvir e para quem, de início timidamente, depois com mais energia, dá um passo de dança e que, pelo menos para alguns dos casais, significa também um passo atrás, até um passado cada vez mais distante, de uma juventude e de uma paixão que prometiam continuar acesas por força de uma qualquer chama eterna — mas há quem, apesar dos cabelos já grisalhos, exiba um rosto emoldurado por um sorriso, como se o tempo não tivesse passado por eles.

Para um lado e para o outro, estende-se um formigueiro humano, andando para cá e para lá e retirando prazer da tepidez dos raios de sol e da suave brisa que agita as copas das árvores debruçadas sobre candeeiros a gás que são réplicas daqueles que decoravam a avenida Prymorsky no século XIX. Num dia normal, esta é, de qualquer maneira, uma zona exclusiva para peões e, bem perto do Duque de Richelieu (com o mar de frente, caminhando para a direita), uma estátua merece muito mais curiosidade — nenhuma outra é tão fotografada em toda a cidade. “Para Pushkin”, dos cidadãos de Odessa, pode ler-se na placa. Nas costas de Pushkin, dominando a praça onde actua uma banda de rock e palco privilegiado de jovens adolescentes com os seus skates, projecta-se, com as suas elegantes colunas brancas, o edifício em tons brancos e rosados que abriga a edilidade mas que em tempos acolheu a bolsa e, já mais tarde, o quartel-general regional soviético. Bem próximo, está um canhão onde muitos gostam de se deixar fotografar, alguns deles certamente desconhecendo que se trata de um troféu capturado às tropas britânicas durante a Guerra da Crimeia.

Ponte para a sogra

Os espectáculos de rua não se extinguem, as crianças são as que mais parecem desfrutar, com os seus balões subindo nos céus e felizes quando os pais, num gesto de carinho, aceitam a presença de uma jovem de sorriso meigo, com a sua touca servindo de caixilho a um rosto bonito e os seus vestidos folhados, enquanto seguram numa cesta os doces que exacerbam a felicidade dos miúdos que vivem este dia ainda mais intensamente do que os adultos.

Caminho agora para o outro lado, para lá da estátua do Duque de Richelieu, como quem imita um romano com a sua toga, há pequeninas pontes que se tornam românticas aos olhos de uns quantos, um café quente para beber, um coração desenhado com cadeados, monumentos onde os olhares se fixam e, ainda mais para diante, o palácio Vorontsov, construído em 1826 num estilo clássico mas com um interior onde não faltam os detalhes árabes para servir de residência àquele que foi o terceiro governador da cidade.

Gasto algum do meu tempo ao lado da estátua de um leão de onde posso observar delicadas colunas que me remetem para a Grécia e, depois, junto delas, observo o porto de Odessa, a esta hora tão sereno como o interior de uma igreja. A mesma tranquilidade embebe a Tyoshchyn Most, a ponte pedonal do período soviético, para os mais intímos conhecida como a ponte da sogra. A história conta-nos que foi levantada na década de 1950 por um oficial comunista para facilitar as visitas da sua mulher à mãe — numa versão menos romântica pretendia somente evitar desculpas para que não pernoitasse daquele lado e a esta pode estar ligada a superstição local de deixar um cadeado nas suas grades e desfazer-se da chave, garantindo, desta forma, anos e anos de felicidade.

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