Fugas - Viagens

  • Rui Gaudêncio
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A cozinha sem disfarces da Galiza

Não foi lá, no entanto, que passou a infância, e aqui a sua história também é idêntica à de milhares de galegos: “Na década de 1970 houve uma grande diáspora. Na Galiza passava-se muita fome. As pessoas emigravam para a Alemanha, Suíça, França e Reino Unido. Os meus pais foram para a Suíça quando eu tinha quatro meses. Voltámos quando fiz sete anos, antes de entrar para a escola. A minha mãe achou que se não fosse nessa altura teria de esperar que eu acabasse o liceu.” Fez o ensino em castelhano. “Quando chegou a democracia, o galego foi usado por elementos de esquerda, com um sentimento de pertença, não necessariamente nacionalista.” Agora já é língua oficial.

Também podemos falar num movimento para a autodeterminação quando falamos da cozinha de Luis Veira. Mas uma autodeterminação diferente. O chef, que entretanto deixou as panelas, começa por dizer que não se pode falar da sua cozinha, ponto. Depois afirma: “É uma cozinha de viagem, que não esquece que estamos rodeados por mar. Estamos na adolescência. Queremos ser mais atrevidos, sem ter os nossos pais por perto.” Que pais são esses? Juan Roca, Pepe Rodriguez Rey (que agora participa no programa de televisão Master Chef Espanha) e José Antonio Campoviejo, nenhum deles galego.

Não admira que Luis Veira tenha falado em “pais” para se referir aos seus mentores, porque não se fala de gastronomia galega sem falar da família. “É muito a tradição de avós, para pais, para filhos. E não é como a cultura basca, de socialização da comida (virada para amigos e para status). Aqui a comida é uma celebração familiar, com pessoas que nos são muito próximas. Estamos na esquina do mundo; [a gastronomia] é sobre as nossas raízes e aquilo que nos ensinaram os nossos bisavós.”

A tradição é um pilar e é usada como “a memória do gosto, o retrogosto”. A de Luis são os gelados da infância, a manteiga que a avó fazia, os pimentos e as coisas queimadas que ela preparava no forno da casa de campo, a apenas 10 minutos daqui, onde tinha uma hortinha.

Xan Domínguez acrescenta: “Em quatro anos [de vida da Árbore] conseguimos liberdade. É a bomba! O Luis faz o que quer, tanto lhe dá se as pessoas acham que se encaixa ou não.” Palavras possíveis para descrever o que se passa à mesa: “Criatividade, tradição, diversão, sabor, mistura do mar e da montanha, que é diferente do mar e montanha da Catalunha. É uma ostra que são 100 ostras na boca porque é uma explosão de sabor.”

Ao longo do almoço, a carne só aparece na forma de uma cereja. Isto é, uma bola de foie-gras coberta por uma fina camada de doce de cereja, que vem pousada no prato como se tivesse acabado de cair da árvore. De resto, há muito marisco (ostras, vieiras, lingueirão) e peixe, confeccionados com o mínimo de temperatura possível para que guardem todo o seu sabor natural. Há ovo cru, sardinha em cura com sal que cozinha apenas oito minutos, pescada cozida e 63 graus . “A técnica sempre ao serviço do sabor.”

Os pratos são microcosmos, pequenos jogos”(o menu de 10 pratos custa 55 euros, o o de 15 custa 70). O chef volta a falar da sua “adolescência” para descrever a irreverência que não quer perder: “Estou a sair de casa dos pais. Poderia dizer que estou numa crise hormonal. Quero que as pessoas que se sentam à mesa tenham um orgasmo gastronómico.” Quero o que aquela senhora está a comer, se faz favor.

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