Fugas - Viagens

  • A fusão dos negros da África subsariana com os habitantes do Magrebe resultou na gnawa, uma dança tradicional executada pelos berberes
    A fusão dos negros da África subsariana com os habitantes do Magrebe resultou na gnawa, uma dança tradicional executada pelos berberes Daniel Rocha
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  • Aicha, uma das mulheres que trabalha na cooperativa
    Aicha, uma das mulheres que trabalha na cooperativa Daniel Rocha
  • Hmad Bem Amar, um dos responsáveis pela revitalização do ksar El Khorbat
    Hmad Bem Amar, um dos responsáveis pela revitalização do ksar El Khorbat Daniel Rocha
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Majhoul, ou a tâmara mais saborosa do Sul de Marrocos

Mas Hmad não discorreu mais sobre como era a vida antes. Preferiu alongar-se a dizer como está a conseguir que seja a vida depois, isto é, agora. Já há luz e saneamento, mas ainda há muitos problemas de sobrevivência. De subsistência. “Don’t feed beggars”, lia-se numa das paredes à entrada da aldeia.

O Museu do Oásis é apenas um dos pilares do projecto do Ksar El Khorbat, que arrancou em 2002. Agora que ali param visitantes para conhecer o Museu do Oásis (foram 8460 visitas, desde 2002), e agora que são oferecidas soluções de alojamento “a todos os turistas que não procuram só um sítio para comer e para dormir, mas sim ter experiências com a comunidade, contribuir para um desenvolvimento sustentável”, já é possível ver crescer a população e melhorar-lhes as condições de vida.

 

Muito por fazer

Viviam 52 famílias no ksar El Khorbat em 2002, eram já 88 famílias em 2016. Eram 152 casas em 2002 e mais de metade estavam destruídas, à força do abandono e das intempéries. Foram, entretanto, sendo reconstruídas, ao ritmo do novo museu (que ocupa 23 salas e permite uma viagem bem documentada ao que é a vida dos nómadas e como é que ela se cruza com o sedentarismo dos ksars e dos oásis), ao ritmo da construção de uma creche (onde são já acompanhadas diariamente 90 crianças), ao ritmo da construção de quartos para receber turistas e voluntários — são bem-vindos todos os que queiram oferecer a sua força de trabalho e o seu saber em troca da participação no desenvolvimento de um projecto comunitário.

“Precisamos de todos os saberes e vontades. Precisamos de engenheiros, arquitectos, sociólogos, psicólogos, cozinheiros... aprendizes. Ainda falta fazer muito por aqui”, alerta Hmad. E não está a falar de infraestruturas. Está, outra vez, a falar de oportunidades. “Queremos que os que cá estão não precisem de sair. E que os que saírem para estudar, queiram voltar. Temos de ter argumentos para fixar aqui um jovem que acabou de tirar um curso”, argumenta, demonstrando que o “curso” que frequentou numa década de bomba de gasolina em Barcelona o fez “doutor” em ambições juvenis. “Aqui as mulheres têm um lugar de relevo. Posso dizer-vos, e admitir-vos, que sem elas, nada disto funciona!”

Não lhe faltam ideias para desenvolver El Khorbat. Vão ser precisos licenciados em turismo, em história, em antropologia, para melhorar os circuitos musealizados. Dava jeito desafiar biólogos e químicos a acrescentar saber à milenar técnica de fazer água ou essência de rosas — e são famosas as da região, sobretudo as de Mezgouna; são precisas cinco toneladas de pétalas para fazer um litro de essência de rosa e apenas um quilo para fazer um litro de água de rosas — para, por exemplo, rentabilizar o pequeno jardim aromático que ainda sonha construir.

Mas não existem apenas sonhos naquela lista, também há projectos realizados. Por exemplo, o “mercado justo”, realizado durante uma semana no mês de Abril, e que já é, ele próprio, uma atracção turística, onde artesãos e agricultores podem vender o fruto do seu trabalho e criatividade. Ou uma cooperativa de mulheres, um local onde, o ano todo, as mulheres se encontram para partilhar o tempo dedicado às artes e aos lavores, e que deu oportunidade a muitas artesãs como Aicha. Com 33 anos, nunca casou, vivia com a mãe e com a irmã, sobrevivia da boa vontade dos familiares masculinos. Há dois anos que, para ela, a vida no ksar ficou menos dura — pelo menos tenta trocar palavras com os visitantes que lhe compram os lenços que borda durante os dias. O vocabulário de Aicha é curto — está agora aprender francês com os turistas. O meu berbere é inexistente, o diálogo tem de terminar por aqui: “Sim, agora a vida é muito melhor”. O sorriso no rosto serviu-me como garantia.

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