A palavra, no entanto, é utilizada de uma forma cada vez mais limitada e simplista e, muitas vezes, apenas “para vender”. Há quem aprenda sobre meditação em workshops ou pequenos cursos sem componente prática. “Vêem a mindfulness através de uma apresentação de Power Point”, lamenta. A maioria já chega a Plum Village com ideias pré-concebidas sobre o conceito e torna-se “mais difícil” ensinar. “Se calhar um dia vamos ter de ter um curso de desprogramação no primeiro dia”, ri-se. Ou dar-lhe outro nome. “A certa altura vamos ter de começar a falar mais sobre a palavra e o seu significado. Nós costumamos dizer que estamos interessados naquilo a que chamamos de «mindfulness verdadeira» ou «mindfulness certa»”, ri-se. “Não sei, no final vai acabar por transformar-se numa luta de palavras.”
Dança à volta da fogueira
Todas as noites, o programa do dia seguinte é deixado no quadro do refeitório. A agenda repete-se com pequenas variações. Diferentes sessões de meditação, palestras, partilhas em família. Às 21h30 começa o “silêncio nobre” e às 22h apagam-se as luzes. Nos tempos livres, muitos aproveitam para descansar, dar um passeio pela natureza ou ficar na conversa com outros participantes. Há quem jogue basquetebol ou futebol. Numa clareira entre os pinheiros, um rapaz aprende a jogar dá c?u (ou jianzi, semelhante a uma pena de badmínton mas que se joga com os pés) com um grupo asiático de monges e freiras.
Há quem pratique caminhada meditativa, passo ante passo, junto a um dos lagos cobertos de flores de lótus. Quem faça ioga, escreva em diários, leia, toque guitarra ou desenhe. “Pensava que não precisava assim tanto de relaxar, deste silêncio e desta tranquilidade mas aqui percebi que sim”, conta Ingrid. “Tenho dormido tanto.” A verdade é que ela nem queria muito vir, confessa. Preferia ter feito o caminho francês até Santiago de Compostela, mas os amigos escolheram Plum Village. “Ainda bem que vim. Viajar é bom, mas aqui é muito mais intenso.”
Ao terceiro dia, rapazes e raparigas são separados. Eles ficam em Upper Hamlet, elas vão passar a tarde em Lower Hamlet. Aqueles que não se identificam com nenhum dos géneros seguem até Middle Hamlet, um terceiro mosteiro, mais recente. Descemos com as raparigas até ao mosteiro inaugural, aberto em 1982, hoje residência de freiras. Pelo caminho, atravessamos campos e campos de vinhedos e de girassóis até que, de repente, o horizonte é substituído por fileiras de ameixeiras, que se estendem até as perdermos de vista. É então que percebemos o nome “Plum Village”, “Vila Ameixa”. “São 1250 árvores”, precisa a irmã Hien Nghiem. Uma por cada monge ou freira que, na altura, integrava a Ordem do Entre-Ser, criada por Thich Nhat Hanh em 1966.
Depois de uma palestra e de sessões de dharma sharing – em que os temas giraram, sobretudo, em torno de problemáticas que afectam maioritariamente as mulheres –, jantamos dispersas pelo jardim, enquanto um grupo de freiras acende uma enorme fogueira. Para sobremesa: fatias de melancia, bolachas com chocolate e um balde industrial de massa de pizza, que cada uma enrola no topo de uma cana e deixa a cozer sobre o fogo. Sentimo-nos algures entre uma colónia de férias e uma festa do pijama.