A tarde já começou a baixar, mas o sol ainda é forte. No Maria de Jesus, Adília Manuela e António Xarila, chapéus de palha na cabeça, parecem imunes: ela sentada, ele em pé, preparam as redes. Estamos no fundo da falésia de Azenha do Mar, no porto de pesca que já viu melhores dias, dizem-nos. Agora pesca-se “pouco” (salmonete, sargo, robalo, linguado, polvos…); agora há 11 barcos, quando já foram “mais de 40”; agora parte do porto faz-se praia, do Calhau porque é feita de seixos lisos e cascalho, que por esta hora recebe alguns jovens da terra. Os forasteiros preferem encher o restaurante, no topo da falésia, onde perto das 17h ainda se espera para almoçar.
Estamos na Costa Vicentina quase a despedir-se do Alentejo – fá-lo-á alguns quilómetros abaixo, em Odeceixe. Daqui até lá a costa são falésias e pequenas baías inacessíveis, povoadas de rochas e de cegonhas. Não é necessário embrenharmo-nos muito para as vermos: do lado esquerdo da praia do Calhau, nos penhascos e rochas à laia de ilhas, nidificam cegonhas. E enquanto as observamos a tranquilidade do final de dia é quebrada com a chegada de um carro: portas abertas e música no máximo.
Não foi a regra nesta passagem pela costa alentejana nos últimos dias de Junho. Evitámos as grandes aglomerações e a única outra vez que sentimos os decibéis acima do normal foi na praia do Carvalhal – cortesia do bar de praia e talvez sinal de que esta praia a poucos quilómetros a Sul da Zambujeira do Mar já perdeu o estatuto de “quase segredo”. Algo que se repete ao longo da costa: os motivos até são bons, a melhoria dos acessos às praias; as consequências é que podem ser danosas, o fantasma do desvario algarvio. Porém, esse cenário está, por enquanto, afastado em quase todo o território; mesmo nos postais turísticos do litoral alentejano, como Vila Nova de Milfontes, Zambujeira do Mar, Porto Covo, a construção mantém-se mais (nas duas últimas) ou menos (na primeira) controlada. O que não impede, dizem os locais, que em Agosto se transformem em mini-algarves.
A Fugas desceu da Comporta até Odeceixe tentando descobrir os (últimos?) segredos do litoral alentejano, muito à custa de dicas dos locais – alguns zelosos em manterem segredos que outros revelam. São praias que estão no fim de um “caminho-estreito-depois-do-quarto-pinheiro-a-seguir-ao-monte-abandonado”. Por isso, houve muita tentativa e erro, enquanto seguimos estradas costeiras, percorremos trilhos de terra batida, caminhámos por dunas e pinhais. Fomos picados por mosquitos, arranhámos as pernas, ficámos cobertos de pó e até enlameámos os pés. Atravessámos parte do Parque Nacional do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina e desejámos ter um 4X4 – contudo, sobrevivemos e conquistámos imagens de baías rochosas ou longos areais, mar de várias tonalidades de azuis e verdes e uma calma que não garantimos neste mês e no próximo.
Autocaravana e mar
“Em Julho e Agosto já não se encontra um cantinho. Estão sempre cheias.” Quem o diz é Filomena Timóteo a repartir o pequeno areal de uma baía rochosa, onde o mar entra como uma língua esverdeada, com outro guarda-sol. Não sabe o nome da praia (apesar de vir aqui há muitos anos, vive na zona) que é gémea, mais pequena, de outra que está ao lado. Sabe que as duas já foram de nudismo, como muitas das que vão de São Torpes até Porto Covo. “Agora já não há nudistas.”