De cabo a cabo
De Azeitão para a praia da Foz (Meco) veio Pedro Martins e a família. A tarde já vai bem alta quando se prepara para entrar na água, para duas horas de caça submarina. "Normalmente fico três, quatro horas", diz, enquanto veste o fato de mergulho na enorme plataforma rochosa que antecede o areal, numa reentrância entre arribas altas. "Eu e o meu irmão fomos os primeiros a fazer surf na praia das Bicas, aqui ao lado. Temos filmes dos anos 1980. Descobrimos isto, tem vento sul, ondas boas. Agora vem muita gente." Estas são as duas praias mais "escondidas" da zona, onde o Meco e Alfarim atraem as grandes multidões. Também por isso gosta de caçar aqui, "há menos gente" atrás dos "sargos, robalos, safio, um ou outro polvo".
Mais a sul, o Cabo Espichel. Antes dele, fazemos um desvio na estrada solitária da serra da Azóia para seguirmos o percurso pedestre "Maravilhas do Cabo". Damos por nós num promontório a norte do cabo num cenário primordial e belo: os recortes da costa, a silhueta do santuário, das hospedarias, da ermida mesmo no topo da falésia (Pedra da Mua) - e o trilho de dinossauros (que não temos a certeza de descortinar) na arriba, no fundo da qual se esconde uma praia de seixos e o esqueleto queimado de um carro. Em volta do santuário, mistura de línguas em busca de fotografias de cortar a respiração - excepto Ivo Pólvora e Cátia Mestra, que posam calmamente nas galerias da hospedaria (entaipada) com o traje do casamento, que foi um mês antes. "É um sítio fora do normal", dizem simplesmente, e eles são de perto, do Barreiro. O farol está noutro promontório a sul e está deserto.
Regressamos ao Cabo da Roca. "Está sempre tanto frio", comenta-se com o vento a soprar de todos os lados. O farol é secundário face aos precipícios que rodeiam o cenário onde a serra de Sintra encontra o fim do território europeu. As fotos em torno do padrão exigem espera, o que não sucede no penhasco que parece possivelmente estreito, mas onde um casal de noivos tira fotos - são ingleses, vivem na Holanda e casaram-se dias antes em Portugal. "No fear", afirma o noivo. E se a noiva nos parece hesitante, do alto das suas sandálias brancas, vê-la-emos mais tarde a tomar as vezes do fotógrafo, saltando desempoeiradamente as protecções de madeira. Todos contemplam a cena e, por momentos, as máquinas afastam-se da paisagem para pousarem sobre o casal.
Menos radical é Rita Teixeira, que encontramos na piscina oceânica das Azenhas do Mar calmamente a ler Daisy Miller, de Henry James. Antes de descermos a garganta até à beira-mar, o miradouro dá-nos a melhor vista sobre a aldeia que se desenvolve em crescendo para terminar mesmo em cima da falésia, povoada de casas brancas ("impressionante" e "espectacular", repete um grupo de espanhóis). O mar está bravo, o tempo fechado - no mar, um body-boarder; na piscina são mais os que ficam nas beiras. Uma família do Magoito que sai para almoçar diz que "infelizmente é muitas vezes assim [o tempo]" ; Rita é "do Norte", está habituada. Veio conhecer Sintra e já percorreu a vila; agora são as praias.