Fugas - restaurantes e bares

  • Nuno Ferreira Santos
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Há mais mundo para comer? Claro que sim, dizem Josh e Roberto

Por Alexandra Prado Coelho

Cheiro de glândula de castor, sangue a substituir ovos, gin com formigas, garum como faziam os romanos - o Nordic Food Lab quer ampliar a nossa paleta de sabores.

A que cheira uma glândula de castor? A que sabe um gin com formigas? Como se podem aproveitar as entranhas de um peixe? Roberto Flore e Josh Evans estão no Nordic Food Lab (NFL), em Copenhaga, para encontrar respostas para estas perguntas. E, sobretudo, para nos tentar mostrar que há muito mais mundo comestível do que parece à primeira vista. “Comermos sempre a mesma paleta de sabores torna-nos burros. É como termos uma grande biblioteca cheia do mesmo livro”, diz Josh.

Os dois investigadores vieram a Portugal a convite do Sangue na Guelra, evento satélite do festival Peixe em Lisboa, e antes da apresentação que fizeram no simpósio no auditório no Terreiro do Paço, conversaram com a Fugas na 1300 Taberna, na LX Factory, sobre o conceito de “delicioso” e como podemos transformar coisas menos óbvias em coisas “deliciosas”.

Explicaram o que fazem no NFL, um laboratório que nasceu em 2008 das interrogações de René Redzepi, o chef do Noma, de Copenhaga, considerado o melhor restaurante do mundo. Josh, que é canadiano, chegou em 2012, e Roberto, que é hoje o responsável do NFL e também cozinheiro, chegou em 2013, vindo da sua terra, a Sardenha.

Procuram sabores novos, é isso? “A questão do novo é complicada e, por isso mesmo, interessante”, responde Josh. “O que é novo para umas pessoas não o é para outras. O que se passou nos últimos anos nos países nórdicos é que foi redescoberta uma série de coisas que em algum momento tinham sido esquecidas, como as plantas selvagens. E depois há outras coisas que não são novas para a Humanidade mas são-no para a população daquela região, como é o caso das algas, que os nórdicos não tinham tradição de comer.”

Na apresentação que fizeram no simpósio do Sangue na Guelra, Roberto citou precisamente o exemplo das algas, lembrando que só usamos uma pequena parte das que existem, as que estão mais acessíveis. “Deveríamos ir ao fundo do mar para encontrar as algas na sua melhor forma. Usarmos só as que chegam à praia é como se fôssemos a um pomar e olhássemos apenas para a fruta que está caída no chão e já demasiado madura.”

Um dos projectos em que o NFL está a trabalhar há já algum tempo é o da transformação de insectos em comida “deliciosa”. Trata-se também de algo que para uma parte da Humanidade é alimento, e para outra não. Mas às vezes as fronteiras não são tão definidas como parecem. Veja-se o casu marzu, um queijo da Sardenha, a ilha em que, por coincidência (ou talvez não), Josh e Roberto se conheceram (precisamente, porque Josh aí tinha ido à procura deste queijo).

Roberto explica: “É um queijo que também envolve um tipo de insecto. A fermentação acontece dentro do queijo, os gases produzidos partem a casca, e nesse momento uma mosca específica põe os ovos dentro do queijo, estes transformam-se em larvas, as larvas começam a comer o queijo e há todo um processo que o leva de duro a cremoso. Comemos o queijo no momento certo de maturação e as larvas ainda estão lá dentro. Mas as pessoas pensam sempre mais no queijo do que nos insectos.”

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