O facto de os animais poderem ter comido algumas espécies não quer dizer que sejam comestíveis pelo ser humano. Apenas há uma maneira de diferenciar as “boas” das “más”: conhecendo-as bem. Quando uma pessoa sabe que aquele cogumelo se conhece como “rebiós ou abesó” (Amanita caesarea), está claro que não o vai confundir com o “resalgar” (Amanita muscaria) lavado pela chuva, que é tóxico e alucinogénico. Em geral, as intoxicações produzem-se mais por excesso de confiança que por ignorância. Quem não sabe nada, consulta, mas quem sabe alguma coisa, ignorando o muito que desconhece, pode enganar-se.
Também é importante dizer que nem todas as intoxicações são iguais e perigosas. Há cogumelos que causam problemas pouco tempo depois de serem ingeridos. Nestes casos, pode não ser grave. Se a pessoa vomita, liberta-se o tóxico e em qualquer centro de saúde pode ser resolvido o problema, como se passou com vários intoxicados nos últimos anos com o cogumelo das oliveiras (Omphalotus olearius) ocorridas em Bragança e Évora. Conhece-se uma intoxicação deste tipo muito curiosa. Ocorre com algumas espécies, como o Coprinus atramentarius, quando se consomem com álcool, mas desaparece sem sintomas quando se deixa de consumir álcool (pode tardar vários dias em passar).
O pior tipo de intoxicação é quando vómitos e diarreia se manifestam quatro a seis horas depois de os cogumelos serem comidos. Já se deu o caso de pessoas que comeram “falóides” ao almoço e, como lhes souberam bem, voltaram a comê-las ao jantar, antes de se manifestarem os primeiros sintomas de intoxicação. Nestes casos fala-se de intoxicações de “período longo” e aqui o problema é muito grave. No primeiro momento manifestam-se sintomas gastrointestinais durante horas, com certa violência, depois cedem e podem passar até 24 horas sem sintomas. Traição, porque os sintomas gástricos regressam de forma mais agressiva e o tóxico (amanitinas) passou ao sangue e está circulando por todo o organismo. O órgão mais afectado é o fígado, uma vez que as amanitinas, ao passarem por ele, afectam-no: quando passam à urina, atingem também os rins.
Se o intoxicado não é tratado de forma adequada pode falecer por coma hepático. Por isso, ante a mais mínima suspeita de uma intoxicação deste tipo é necessário recorrer imediatamente ao hospital. Quanto mais rapidamente se iniciar o tratamento, mais probabilidade de êxito há. E deve-se informar o médico da hora da primeira ingestão de cogumelos, levar um pedaço do cogumelo (serve cozinhado) e dar o maior número possível de informação para o poder identificar. Uma dose de 60 gramas de “falóides” chega para intoxicar gravemente a uma pessoa de 70 kg de peso.
O tratamento está baseado na manutenção dos sinais vitais (evitar a desidratação), no impedimento da absorção das toxinas por parte do organismo eliminando-as (lavagem gástrica, sonda naso-gástrica, administração de diuréticos e laxantes), além da aplicação de um protector hepático. Demostrou-se há mais de 30 anos que funciona bem a penicilina cristalizada (G sódica) em grandes doses (1 milhão de UI/hora) para um adulto. No caso de pessoas alérgicas a este medicamento, pode substituir-se por ácido tióctico ou silimarina. Não são antídotos, são simplesmente protectores dos hepatocitos. Apenas nos casos extremos, ou quando o tratamento começa demasiado tarde, é necessário o transplante de fígado. O fígado fica debilitado durante vários meses, mas trata-se de um órgão que pode recuperar-se por si só.