Fugas - Viagens

Nelson Garrido

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Pirenéus aragoneses - Esquiar ao sol

Ligamos, mais tarde, ao jantar, atentos aos pratos típicos, como o rabo de buey e os iogurtes de sobremesa. Percebemos melhor o projecto do Formigal, o projecto da Aramón, por isso não podemos deixar de ir ao Marchica, em Sextas, centro nevrálgico da estância. Cinco minutos de autocarro e estamos na base das pistas, agora só escuridão. E música debitada em altos decibéis, vinda do Marchica, que é feito de madeira reciclada vinda da Áustria e cheira intensamente a madeira. São dois andares em mezanino, pista em baixo com lasers e bola de espelhos. Há alguns resistentes, mas não muitos: os dias começam cedo nas estâncias de esqui.

Esqui para principiantes

Os dias começam cedo e as noites deviam acabar cedo. Mas se assim fosse nunca teríamos olhado a paisagem nevada a brilhar azulada, as pistas sulcadas por luzes amarelas que são os ratracks a alisarem o piso para o dia seguinte, o silêncio quebrado por água que se solta dos pingentes - não está muito frio, sentíramos.

De manhã o vale acorda na sombra - olhamos os picos altos e vemos um brilho pálido. À beira da estrada a neve está suja, mas para lá é alva, manchada de inúmeros pontos em movimento. É para lá que vamos, pensamos. Quase. Os iniciantes - e nós somos iniciantes ansiosos, crentes de que esquiar sempre foi o nosso desígnio - não se vêem da estrada, a sua pista (?) fica mesmo à beira do complexo central de Sextas.

E é por aqui que começamos, para nos equiparmos. Já vimos vestidos para a neve: calças, botas, luvas impermeáveis, várias camadas de camisolas polares que terminam num anorak também impermeável, gorro, óculos de sol e muito creme protector. Falta o equipamento, os esquis e as botas. Ainda não calçamos os esquis, mas já percebemos a dificuldade de caminhar com as botas, um peso morto sem qualquer maleabilidade nos pés. Reaprendemos a andar e arrastamos bastões e esquis sem a elegância de quem passa com eles ao ombro - chegaremos lá, afinal, é o mais fácil. Pés na neve e Alfonso, o professor, ao lado: esquis paralelos para encaixar nas botas. Agora, vamos chegar à pista - por enquanto, os bastões revelam-se os melhores amigos e teremos renitência em largá-los, mais tarde.

Não aprendemos a deslizar, se calhar é um dado adquirido. Aprendemos a deslocar-nos em declives, de lado, esquis sempre paralelos, o lado de dentro levemente enterrado na neve - mais tarde, percebemos, por exemplo de outros, que se subirmos pequenos desníveis com os esquis abertos em "v", durante uns segundos não pareceremos principiantes. Aprendemos os primeiros passos na neve em coreografia lenta. E, entretanto, sabemos que a melhor posição para o esqui são os joelhos flectidos com o corpo a fugir para a frente. No entanto, só no topo do declive - com direito a passadeira rolante para o alcançar - o compreendemos verdadeiramente e aprendemos a travar, pernas afastadas, esquis virados para dentro mas, atenção!, sem nunca se tocarem. Largamos os bastões a medo - mas com eles os braços devem ir afastados do corpo, mão à frente e bastões longe do chão - e afinal até é mais fácil. Mas quando pensamos que já sabemos tudo, temos de aprender a curvar, esquis virados para o lado que queremos seguir, o peso assente em determinado ponto - e joelhos flectidos, o corpo para a frente...

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