Fugas - Viagens

Paulo Ricca

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Uma aventura nas aldeias do xisto

A equipa russa, totalmente feminina, passa apressadamente. "Nos últimos dias, as mulheres são bem mais fortes do que os homens, em provas mais longas, sobretudo", sublinha Frederico Tiago, da Associação Portuguesa de Corridas de Aventura, o nosso guia e também participante habitual nestas provas. Mas este ainda é o terceiro dia, há mais quatro pela frente para cumprir os 900 quilómetros de percurso (as corridas de aventura devidem-se em três categorias: curta distância, até oito horas; 24 horas, entre 150 e 250 quilómetros; e longa distância, entre 300 e mais de 1000 quilómetros). O suecos City Wolfs vêm calmamente, dizem que falharam dois check-points por causa do nevoeiro dois ou três metros de visibilidade apenas, queixam-se.

Voltamos à estrada e ao cenário. Ali em baixo, um planalto de erva amarela entre seara de pedras impressiona. "Era uma povoação", dizem-nos. Agora, resta uma pequena igreja de pedra esventrada. Mais à frente, um vale glaciar, garganta profunda que corre até Manteigas, onde já evoluem equipas, apenas pontos coloridos.

Fazemos escala no hotel para seguir para outro ponto do percurso, onde a BTT será o meio de progressão, e a azáfama é imensa. As bicicletas estão a receber as últimas afinações, algumas equipas descansam ao sol. A portuguesa Globaz.pt -Boxit está em torno de uma carrinha branca. Dois membros dormem em boxers, outro trata de roupa. Jorge Xará, 31 anos, engenheiro aeronáutico, já foi a seis ou sete países nesta coisa das corridas de aventura. "Faço sete ou oito provas por ano, uma delas, grande", conta. "Este ano, excepcionalmente, fiz duas". Tudo começou como brincadeira entre amigos, até que se entranhou. "É duro e violento, há o contacto com a natureza, o espírito competitivo, a orientação", enumera. O seu objectivo? "Chegar ao fim". Para isso treinou seis dias por semana, 14 horas semanais.

Barroca quase deserta

As bicicletas vão saindo e mais uma vez subimos e descemos montes para as ver passar, em caminhos extremamente picados, armadilhados de pedras e buracos, por entre bosques de pinheiros e carvalhos e vista para a Cova da Beira. Vão até Ourondo, onde as bicicletas ficam para trás e as canoas seguem em frente.

Entramos finalmente numa aldeia do xisto, Barroca. Aqui, termina um percurso em canoagem (e começa outro em BTT). Alguns já estão de saída, montados em bicicletas com as luzes a brilhar, outros ainda estão a chegar à margem do Zêzere. A escuridão é total à beira-rio e a organização faz sinais de luzes quando vislumbra um caiaque a aproximar-se. É tudo rápido e tumultuoso: "Onde fazemos o check-in?" é a pergunta que todas as equipas fazem quando largam os caiaques. E precipitam-se na escuridão na direcção indicada, enquanto membros da organização recolhem os caiaques. "Está completamente furado" ou "devia parecer mais um submarino do que uma canoa", são comentários comuns.

Num largo de Barroca, há uma bancada da organização e um posto de controlo. "Nunca Barroca teve tanta confusão quanto hoje". Estamos numa "feira da ladra", há roupas, sapatos, sacos espalhados pelo chão em confusão,há bicicletas encostadas, há pessoas deitadas, sentadas, a trocarem de roupa, a massajarem os pés. Stuart Lynch é um deles e um campeão do mundo (membro da neo-zelandesa Oríon que perderia o título na prova portuguesa para os britânicos da Helly Hansen Prunesco). "Vamos descansar um pouco, talvez duas horas. Se calhar nem tanto", explica. O dia correu bem, mas houve um momento de "pânico", quando acharam que não iam chegar ao rio a tempo para fazer a etapa de canoagem (chegaram às 15h00, o limite era 15h30).

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