Na Rua do Chafariz, percebe-se que algo mexe por ali: há uma série de lajes de xisto à espera de serem usadas algo está a mudar, mas são tantas as vielas onde as casas de xisto de um ou dois andares, algumas impossivelmente estreitas, às vezes em passadiço sobre a rua, estão arruinadas. Algumas sobrevivem desde os anos 20, outras são novas, nota-se bem. E grandes.
Nunca paramos de subir. Os telhados da aldeia estendemse para baixo, para cima mais ruas e fachadas de casas de xisto, mas sobretudo pintadas. A Foz do Cobrão está na rota das Aldeias do Xisto mas nem todos estão convencidos com o xisto, dizemos. Maria da Conceição, 61 anos, mora numa casa amarela (clara) e branca, nova. Xisto nem pensar. "No Norte gosto de ver, aqui estava farta disso". Mas isso não significa que a integração na rota não tenha tido os seus benefícios "há dias em que chegam excursões", diz, "e as pessoas andam por aí. E vão ao restaurante [o Vale Mourão], ao rio...". De resto, a vida corre igual, há o café, a mercearia, o centro de dia e à terça-feira vem o autocarro para Vila Velha de Ródão. "Uma pessoa vai às compras, distrai-se".
Hoje há distracção na aldeia. Magusto às 17h00, no Centro de Dia (em breve haverá também um lar), que Joaquim Viegas mostra orgulhoso. Tem 75 anos e encontramo-lo a caminhar vagarosamente já no topo da aldeia, a ver os grifos que vivem nos montes do outro lado, aponta com a bengala: "Recuperaram dois e vieram lançá-los há pouco tempo".
Foi operário na Lisnave, está reformado há 21 anos. Lembrase de quando a aldeia era quase toda de xisto, "mas puseram tudo abaixo". Ele próprio o fez. "A minha [casa] era de pedra. Deitei tudo abaixo, é mais confortável assim". E "mais limpo": "o xisto é bonito para criar teias de aranha e bichos". Quanto aos incentivos, "poucos beneficiam com isso". O xisto "é mais caro e mais trabalhoso", e as pessoas vivem com "o dinheiro contado".
Há recuperação, um dos seus próprios filhos (tem três, dois em Lisboa e outro em castelo Branco) recuperou uma casa de xisto. E "um engenheiro que não é de cá mas tem um colega que casou aqui" veio à aldeia e comprou logo uma casa, que está a recuperar de forma tradicional. É a população de fim-de-semana, "12 ou 14" pessoas que se juntam aos "58, 60" habitantes permanentes.
Joaquim Viegas tem um orgulho visível na aldeia. Tanto que insiste em levar-nos onde ainda não estivemos. Seguimo-lo de boa vontade até à beira-rio, por um caminho estreito de terra de um lado, um pouco abaixo, pequenos campos até ao rio (a encosta em frente ainda recupera de um incêndio e entre as "ruínas" o tronco de um sobreiro que "teria 200 anos"), do outro as "tulhas", de xisto: cada agricultor tinha a sua, onde punha as azeitonas até à altura de irem para o lagar comunitário.
O lagar está ao fundo do caminho e ainda vemos os restos da prensa das azeitonas, mas agora é uma sala de espectáculos. Faz parte do "complexo cultural", juntamente com a antiga fábrica de lanifícios "teria mais de cem anos, deixou de laborar nos anos 30", onde funciona um centro de interpretação (que hoje está fechado). Lá atrás, há uma ponte de madeira, moderna, sobre o rio, que ali é um espelho antes de cair mais abaixo, há ruínas de moinhos e a paisagem é inequivocamente bucólica.