Vamos pelo "trilho ideal", diz Helena, para quem quer estar perto dos lagos, porque o Parque Nacional dos Lagos Plitvicka é muito mais do que eles que na verdade correspondem a menos de três por cento dos seus 300 km2. Sobe dos 380 aos 1280 metros, passa por aldeias, prados, florestas - incluindo uma virgem - proporcionando um caleidoscópio de experiências que pode incluir encontros mais ou menos imediatos com alguma da fauna que povoa o local, como lobos, ursos, linces. Os responsáveis querem desviar grande parte do milhão de visitantes anuais da zona dos lagos acenando com actividades fora da sua órbita como o ciclismo, o remo ou o esqui, para lá das caminhadas.
Natureza líquida
Nós, que não perdemos os lagos de vista, deixamos o parque seguindo o curso do rio que os alimenta (e onde eles acabam por despenhar-se), o Korana. Vamos na direcção da sua nascente até à cidade de Slunj. Chegamos numa tarde em que se ultimam os preparativos para um festival de reggae e ska a acontecer nessa noite: há bancas montadas vendendo carne assada na brasa, artesanato, CD, passam bicicletas de montanha e, à beira-rio, tendas cobrem o relvado. Mas é a à entrada da cidade, em Rastoke, que nos detemos num cenário bucólico que nos transporta a outros tempos, alimentados pela força dos dois rios que se cruzam aqui, o Korana e o Slunjcica (que nasce a oito quilómetros).
Por esta altura já não nos surpreendemos: este cruzamento é tudo menos vulgar e faz-se entre uma série de de quedas de água e cascatas, ao pé de nós ou no fundo de abismos dos quais temos vista privilegiada - eis o "pequeno Plitvicka", com a vantagem de se poder mergulhar literalmente. Se fôssemos viciados em adrenalina podíamos, aliás, juntar-nos aos grupos que fazem rafting, saltando por vezes alturas extremas ou baixando rápidos sucessivos passando rente ao moinhos de pedra - porém, essa é matéria que deve ser deixada para profissionais (anualmente realiza-se aqui a prova europeia Rast Raft). Nós contentamo-nos em deambular por Rastoke, observando o turbilhão de águas, verdes e azuis, que parecem vir de todo o lado e que alimentaram a criação deste pequeno povoado que agora é só para turista ver, à laia de parque de lazer temático: Rastoke era uma aldeia de moinhos de água e o que vemos é isso mesmo, como se estivéssemos no século XVIII, num cenário verde ao extremo, que recuperou sem mácula aparente das feridas da Guerra da Independência da Croácia, quando foi destruída pelos sérvios. Entre os espaços museológicos há restaurante, café e grandes espaços relvados com recantos tranquilos.
Contudo o cenário muda: é o rio Gacka que se nos apresenta pela frente langoroso, cortando caminho entre campos verdes pintalgados de amarelo e cravados de moinhos - ao longe, montanhas, mais perto, o campanário de uma igreja cujos sinos ribombam. As nossas canoas já estão no rio e o passeio faz-se sem sobressaltos nestas água gentis com uma tranquilidade que permite pousar os remos e tirar fotos.
Algo que nas água do rio Mrežnica só podemos fazer em momentos de paragem. Afinal, aqui há momentos de revoltas aquáticas que enfrentamos em rafts amarelas e equipados com fatos isotérmicos - parecem-nos desnecessários sob o sol forte, vão-nos parecer pouco dentro de água. Sim, é verdade que viramos numa das cascatas, mas noutras ocasiões os mergulhos são mesmo obrigatórios para vencer os desníveis do percurso. Mas entre a adrenalina de uns troços vive-se a calmaria de outros que permite até ir às margens colher flores ou perscrutar as fragas onde, entre vegetação, se ocultam pequenas grutas que foram refúgio em tempos de guerra. Quando atracamos é numa ilhota ligada à margem por pequenas pontes e quando pensamos que tinha terminada a experiência temos um almoço pantagruélico à espera, à boa maneira croata. O assador está a trabalhar horas extraordinárias e entre as iguarias na brasa, ainda temos espaço para provar o prato mais famoso de Lika: batatas assadas com cordeiro cozinhdos sob as cinzas numa panela de ferro.