Longe de ortodoxias
É pouco normal um hotel ter directora artística, mas na verdade o Lloyd é um hotel pouco normal. E o facto de ser um hotel de uma a cinco estrelas é o mais normal de tudo. Também ele nasceu para responder ao desafio de estabelecer um novo coração em Amesterdão Leste (Oostelijk Havengebied), entre o IJ e o Rijnkanaal, que desse consistência à visão que a autarquia tinha para a zona. Há dez anos isto era um porto, quando se decidiu criar bairros sociais (uma grande bandeira holandesa) e atrair artistas à vizinhança. O Hotel Lloyd foi a âncora da reabilitação e a verdade é que assim funciona, tendo contribuído para mudar a dinâmica da zona. “Creio que é difícil uma cidade mudar uma parte assim”, reconhece Suzanne Oxenaar, a directora artística, “mas quando todos trabalham juntos e estão abertos a novas possibilidades, tudo é possível”. Por aqui se vê a teia de interesses que constroem a “nova” Amesterdão.
Nenhum dos proprietários do hotel tinha qualquer experiência em hotelaria — Suzanne é curadora de arte em espaços públicos e o sócio historiador de arte. Mas aceitaram o desafio de criar um novo conceito hoteleiro, uma quase-missão: “como mudar a bagagem cultural das pessoas que visitam Amesterdão?”. Pondo-os em contacto com a cultura holandesa. Assim nasce o Hotel Lloyd & Embaixada Cultural.
O contacto com a cultura holandesa começa logo com o próprio edifício, imponente, de tijolo escurecido pelo tempo, testemunho de uma “história pesada”. Foi o último poiso europeu de gerações de emigrantes que chegavam da Europa de leste, uns a fugir dos pogroms outros a fugir da miséria. Chegavam de comboio, cuja linha vem até aqui, e embarcavam nos navios rumo ao Novo Mundo. Durante a Segunda Guerra Mundial converteu-se em abrigo para judeus fugidos da Alemanha e após o término do conflito tornou-se uma prisão para grevistas e depois ainda para jovens. Esteve abandonado até se converter em hotel com 172 quartos que guarda a história do edifício, do bairro, da cidade e um pouco da Europa.
Esta foi uma maneira de comunicar com os hóspedes, portanto, através da arquitectura. Outra forma é abrir-se ao que se passa na cidade, de uma maneira ou de outra — por exemplo, as celebrações do mui holandês Sinterklaas, exposições e outros eventos culturais. Quando os hóspedes chegam através de instituições culturais que fazem parte da “embaixada”, o hotel trata de os pôr em contacto com pessoas que fazem o mesmo em Amesterdão. Como hotel de poucas ou muitas estrelas, tanto se pode dormir numa camarata com a casa de banho no corredor, como em suites gigantescas, todas diferentes e muito pouco ortodoxas. “Vemo-las também como espaços de exposições temporárias”, explica a directora artística.
Esta não é uma questão negligenciável uma vez que o Lloyd é um hotel com design — “não de design”, sublinha Suzanne Oxenaar . O conceito correu tão bem que os mesmos sócios abriram o Hotel The Exchange, este bem no centro de Amesterdão, a dois passos da estação central, com o mesmo conceito de um a cinco estrelas e com um enfoque na moda. “Fashion hotel”, lê-se no site, e o espaço vive à altura: cada quarto foi vestido como um modelo, por estudantes da academia de moda — é possível, por exemplo, dormir na maior saia do mundo. E, em breve, estes dois hotéis terão a companhia do Hotel Sweets (o nome joga com a fonética de suites) que não terá um espaço, mas sim 26. As antigas bridge water houses, as casas dos responsáveis por abrirem e fecharem as pontes ao ritmo da passagem dos barcos (um processo agora digitalizado), vão ser transformadas em suites. Permitirá “uma nova visão sociológica da cidade” e uma “relação próxima com a água”. Afinal, as casas (as primeira seis abrirão em Março) tanto são pequenas como autocaravanas ou pequenos estúdio, estão no centro ou fora, em bairros mais ou menos nobres — e abrangem todos os períodos do século XVII em diante.