Fugas - Viagens

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A floresta de Sandokan é do tempo dos dinossauros

Os meus receios desvanecem-se com o aproximar de visitantes. O respirar ofegante e alguns gemidos provocados pelo cansaço são perceptíveis à distância. Pela fisionomia e língua familiar, depreendo que sejam malaios. São três mais um guia do parque, que eu dispensara por considerar que o percurso seria tangível de forma autónoma. Dois deles retiram sanguessugas dos gémeos ensanguentados. O guia utiliza uma pequena faca de mato e uma espécie de lima para soltar estes hematófagos tão comuns nestas paragens. Valeram-me as calças dentro das meias grossas ou, então, o meu tipo de sangue não aguçou o apetite dos parasitas.

A descida faz-se a passo de caracol; todos os cuidados são poucos face ao perigo de uma queda iminente e à quantidade de pequenos animais, rastejantes e voadores, que enxameiam o lugar. Já os de maior porte são de raro avistamento, habitando no interior da selva, a vários dias de caminhada.

De volta ao minúsculo cais de embarque, escuto uma conversa curiosa entre um miúdo e o seu pai. Diria, pela pinta florida, tratarem-se de norte-americanos.

“Esta selva tem muitos bichos?”

“Tem, sim, tigres, rinocerontes de Sumatra, cobras, ursos, lagartos, formigas, gigantes...”

“E dinossauros?”

“Penso que não, mas, sabes, filho, esta floresta, que é a mais antiga do Mundo, é do tempo dos dinossauros, só não sei se eles andaram por aqui.”

O homem estudara os manuais. Com 130 milhões de anos, mais dez do que a Amazónia, por exemplo, Taman Negara é a única floresta do planeta a ter sobrevivido às Eras do Gelo e caprichos da natureza, subentenda-se terramotos, actividade vulcânica e outros sobressaltos geológicos.

A selva cerrada antecipa o crepúsculo precipitado, impondo um regresso rápido à outra banda. Embalo o estômago num restaurante que balouça sobre águas pachorrentas. Estava ansioso por partilhar as novidades com a minha amiga osga antes de voltar a sair para o safari nocturno.

Encontros imediatos

A natureza local é infinitamente variada e abriga uma série de raros e extraordinários animais como o lagarto monitor, do grupo dos dragões de Komodo. O seu porte avantajado intimida e com este optei por não jogar ao sério, contornando o bichinho que circundava a porta do meu isolado mini-apartamento. Como não há duas sem três, voltei a vociferar contra o breu nocturno - ou terá sido contra os meus receios (in)conscientes?

Juntei-me ao reduzido grupo de temerários que partiram em duas carrinhas de caixa aberta, vulgo pick-up, à procura de emoções fortes. O lamacento e caudaloso rio Tahan faz de fronteira entre o misterioso mundo de Taman Negara e a parte onde vivem os humanos, não implicando, porém, menor fauna e flora do lado “de cá”. Mais de 350 espécies de pássaros, 14.000 de plantas e 210 de mamíferos podem ser encontradas dentro e fora do parque nacional mais antigo da Malásia, fundado em 1937. Um por cento destes números sobraria para saciar o meu apetite aventureiro, mas o tempo e o holofote apenas avistavam algumas aves a dormitar em samambaias, outras nas gigantes árvores de nyatuh ou nas jelutong – as maiores, com 80 metros, estão dentro do parque e chamam-se tualang, bem como as raflésias, as maiores flores do mundo.

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