Fugas - Viagens

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Swansea é como Dylan Thomas: só se percebe através da alma

- Um dos lugares que ele costumava frequentar era o Tavern, aqui em Uplands, que continua aberto ao público e é fácil de encontrar.

Dylan Thomas era um grande apreciador de cerveja, um boémio, um génio que facilmente mudava de humor e que, alegadamente, se aborrecia de morte ao fim de algum tempo com os seus amigos, entregando-se então à bebida com uma paixão ainda maior da que sentia pela escrita. “Penso que está alguém a aborrecer-me. E esse sou eu.”

Encontro, seguindo as indicações de Patricia Daly, o Tavern, e recordo as suas palavras sobre a vida turbulenta do escritor.

- A maior parte das pessoas identifica ou define Dylan Thomas como um bêbedo, um homem cheio de dívidas e com um final de vida em circunstâncias pouco claras. Ele é muito mais do que um alcoólico: é um verdadeiro bardo galês. É uma questão de humanidade em toda a sua fragilidade, porque ele era, de facto, um ser frágil. Ao contrário do que sempre demonstrou em público, Dylan Thomas era profundamente religioso. Mas sendo um bardo galês, essa forma de estar é intrínseca ao seu estado consciente. Faz parte do seu DNA. E é isso que faz dele grandioso.

O poeta incompreendido

Considerado ateísta, Dylan Thomas assemelha-se mais a um híbrido e são vários os documentos que dão razão à verdade de Patricia Daly. Em 1951, o poeta escrevia: “Estes são poemas em louvor a Deus de um homem que não acredita em Deus.” Jesus é uma figura que persistentemente ocupa espaço no seu trabalho, a mãe era uma mulher que frequentava a igreja diariamente mas nada impedia Dylan Thomas de expressar o seu aborrecimento perante a religião. Ao tio, reverendo David Rees, a quem ele chamava “reverendo de merda, piedosa fraude”, escreveu um dia: “Odeio-te desde a tua caspa até aos teus cornos.” O padre achava, por esse tempo, que o sobrinho deveria ser internado num manicómio.

Percorro o trajecto de volta, as gaivotas riscam o céu como um prenúncio de chuva, ao fundo, estendendo-se até ao horizonte, o mar confundindo-se com o tecto do mundo. As ideias de Patricia Daly fulguram no meu cérebro. Dylan Thomas – a quem Bob Dylan, aliás Robert Allen Zimmerman, roubou o nome - começou por fazer viagens pontuais a Londres mas acabaria por se instalar na capital inglesa, já com Caitlin Macnamara, com quem travara conhecimento quando a jovem loura, de olhos azuis e de descendência irlandesa, havia completado 22 anos – quatro após ter fugido de casa na esperança de fazer carreira como bailarina. O escritor gostava de comentar, no seu círculo de amigos, que dez minutos após ser apresentado a Caitlin Macnamara já os dois estavam na cama. Mas numa das cartas recentemente tornadas públicas, escrita à mulher e que pode ser apreciada no Dylan Thomas Centre, o escritor assume uma atitude mais vagarosa. “Querida Caitlin, amo-te para sempre mas o trabalho na BBC ocupa-me de tal forma que não tenho tempo de me deslocar ao banco, entre as 10 e as 15 horas, para te enviar um cheque.”

- Dylan Thomas era um poeta muito sensível que satirizava o seu povo mas de uma forma muito simpática. Ele amava Swansea e as suas gentes e, se tem permanecido em Gales, em vez de viajar para Londres, a sua vida teria sido bem melhor. Ao mesmo tempo, acho que Caitlin não lhe prestou qualquer favor ao longo da sua existência em comum.

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