Entra no eléctrico, senta-se ao nosso lado e não tarda a meter conversa. É chileno de nascença, sueco desde pequenino, professor de música, dá aulas a crianças, toca vários instrumentos e confessa que nunca se aventurou a vestir a pele de homem-orquestra. Também canta, mas não será o seu forte. Comenta o tempo, está sol e bastante calor neste final de tarde, e as ruas estão apinhadas de gente que sai do trabalho, que espera nas paragens, que passeia pelas ruas, que vai beber um copo antes de ir para casa — alguns já têm o fato colante de jogging no corpo e auriculares nos ouvidos.
Pergunta-nos educadamente o que fazemos por ali. Contamos ao de leve. “Tens aí um mapa da cidade?”, pergunta-nos. Enfiamos os olhos na carteira, remexemos e remexemos e não encontramos. “Espera um segundo.” Pedimos um emprestado a uma colega de viagem sentada alguns bancos mais à frente. “Aqui está.” Pega numa caneta preta e assinala alguns locais a visitar com uma breve explicação. Fala-nos sobre a importância de aprender música desde cedo, como ali acontece, quer saber como funciona o sistema de ensino da música em Portugal. Explicamos que é como tudo na vida, há opções para vários gostos e carteiras e qualquer idade. Revela-nos que está prestes a casar e que irá passar a lua-de-mel a Lisboa em Agosto. “A sério? Que coincidência!”, exclamamos.
Quer saber o que há para visitar, põe-nos o seu telemóvel nas mãos e pede-nos para escrever alguns sítios em português não vá a memória esquecê-los e para ajudá-lo na pesquisa que fará antes de partir. Vai soletrando alguns nomes, olha-nos à espera das correcções. “‘Ba-rro A-to’. É assim que se diz?”. Ri-se e repete. Chega à sua paragem, agradece as dicas, despede-se com um sorriso e um aperto de mão e vai à sua vida. A viagem foi curta, a conversa veloz. Tão veloz que o nome do chileno sueco, de pele morena, aliança de comprometido no dedo, se desvaneceu no meio de tantas frases trocadas num eléctrico azul de Gotemburgo. Não deverá faltar muito para andar pelas ruas de Lisboa.
Está sol. Mais de 25 graus. Depressa arrumamos as camisolas mais quentes, as meias e os agasalhos da noite para o fundo da mala. Mas o que faz um impermeável verde até aos pés no meio da roupa? E porque nos esquecemos do biquíni? A piscina ao ar livre no meio da cidade, e que quase destoa da paisagem, está lotada de suecos com vontade de refrescar o corpo — vimo-la de relance na viagem do eléctrico azul. Os mais pequenos chapinham na água, os adultos mergulham, alguns procuram protecção à sombra das árvores. O sol é muito bem-vindo no Norte da Europa e aqui não é excepção. O tempo frio, as poucas horas de sol, a neve que cai e que em algumas ruas é automaticamente derretida por um sistema que aquece as pedras da calçada, já lá vão. Chuva? Nem vê-la. O céu dá-nos sol. Muito sol e calor.
Na cosmopolita Gotemburgo, na costa Oeste da Suécia, moram cerca de 500 mil habitantes que têm à disposição um território sem grandes inclinações — vislumbraremos uma elevação de terra a que chamam montanha, mas que para nós não passa de um pequeno monte. A cidade é praticamente plana, amiga das bicicletas com 486 quilómetros de ciclovias, com vários parques verdes que enchem em dias de sol. Há casais que estendem a toalha de praia e se espreguiçam na relva no fim de mais um dia de trabalho. Há amigos que se encontram para combinar o que fazer à noite. Crianças que brincam, andam de bicicleta, aproveitam a água que sai de um chafariz para molhar a cabeça e o resto do corpo. O clima está óptimo, melhor do que alguma vez imagináramos, e por nada deste mundo Gotemburgo desperdiça esse abençoado tempo. Há gente nas esplanadas, nos cafés e restaurantes, nos parques e ruas, nos barcos que passeiam os turistas que não dão descanso ao rio. “O que se passa ali? É um casamento, não é? E aquela ali deve ser a noiva, não?”, perguntamos a Stefan Gadd, do Turismo de Gotemburgo, que nos dá as boas-vindas depois de arrumarmos as malas no hotel e sairmos para a rua. “Não é um casamento, é uma festa de final de ano dos alunos do liceu”, esclarece. Pelas roupas, juraríamos que seria um casamento se não reparássemos que os convidados são muito jovens. As aulas já acabaram e os alunos do secundário vestem os fatos de gala para festas que à porta de bares mais parecem casamentos à espera da boda.