"Lembro-me de que, por trás da casa onde cresci, existe uma colina suave. A aldeia não estava localizada mesmo nas montanhas mas, no Inverno, havia sempre neve nessa colina. Por isso, o meu pai construiu uma pequena pista de esqui e foi dessa forma, com apenas três anos, que aprendi a esquiar.”
Os picos, acima de Vaduz, ainda estão nevados, o céu veste-se de um azul radioso, a paisagem está embebida de silêncio, de uma serenidade que convida à contemplação.
“Mas no Liechtenstein também gostamos muito de futebol! É um dos desportos mais populares.”
Martin Knöpfel tem motivos para uma inflexão irónica: evocar o nome do Liechtenstein é, para a maioria dos portugueses, sinónimo de goleada. Dificilmente outra palavra lhe está tão fortemente associada e não é por acaso que um antigo seleccionador, o alemão Ralf Loose, um jogador decente em clubes como o Borussia Dortmund e o Fortuna Dusseldorf, era mais conhecido por Ralf “Looser”, tantas e tão expressivas são (cada vez menos) as derrotas desta selecção que tanto pode ter um produtor de vinho como um professor primário nos seus quadros pouco profissionais — e num país que não tem mais de três mil homens entre os 15 e os 35 anos.
Abaixo das montanhas que recortam o azul, sobre um penhasco, 120 metros na vertical, levanta-se o Schloss Vaduz, sentinela da cidade e residência oficial do príncipe Hans-Adam II (se bem que, desde 2004, é o filho mais velho, Alois Philipp Maria, quem gere a maior parte das situações). Todos os anos, a 15 de Agosto, dia nacional do Liechtenstein, Hans-Adam II convida os quase 35 mil habitantes do principado para beber um copo de cerveja ou de vinho, na antecâmara de um fogo-de-artifício que enche de cor os céus de Vaduz. Durante os restantes dias do ano, o castelo permanece fechado ao público, reduzindo ainda mais a já de si escassa lista de locais de interesse a visitar na capital — ao primeiro impacto sem alma, sem charme, mais para a frente afectiva e calorosa.
O Schloos Vaduz terá sido construído como fortaleza no século XII mas a referência mais antiga em documentos data de 1322, quase 400 anos antes de ser adquirido pela família real, que dele fez residência oficial entre 1712 e 1732, altura em que começou a mostrar sinais de decadência. É já no início do século passado, entre 1905 e 1912, que é alvo de obras de restauração e, mais tarde, por ordem do príncipe Franz Josef, aumentado para se tornar, a partir de 1939, na residência oficial desta família com raízes na Áustria e, actualmente, a mais rica da Europa, incluindo a monarquia inglesa.
Até à chegada de Franz Josef ao poder, nenhum dos seus antecessores mostrou particular interesse em viver nestas terras, preferindo o conforto dos seus palácios vienenses — que raramente abandonavam. Aquele príncipe foi, na verdade, o primeiro monarca a viver no Liechtenstein, juntamente com a sua adorada Gina, a mulher que o acompanhou em muitos dos passos que provocaram uma verdadeira metamorfose no principado: de uma pobre nação rural a um rico estado bancário. Um desenvolvimento que está directamente ligado ao enriquecimento do país e da monarquia que, ao contrário do que acontece em outras nações, não é suportada financeiramente pelos contribuintes. A dívida externa foi liquidada com património da família, o maior banco do país é propriedade do príncipe e a carga fiscal é baixa, o que explica o facto de 75 mil empresas (mais do que o dobro do número de habitantes) estarem registadas no Liechtenstein.