Está classificado como Imóvel de Interesse Público desde 1982 e foi esse o mote que levou Mário pela primeira vez ao Penedo do Lexim, há mais de 20 anos. Na altura, trabalhava como técnico no Instituto Português do Património Cultural (IPPC; substituído pelo IPPAR em 1992 e integrado no IGESPAR em 2006) e fazia parte da equipa que andava a percorrer o país para inventariar todo o património arquitectónico e arqueológico classificado em Portugal Continental.
A vista lá de cima é lindíssima, conta, mas as últimas chuvas deixaram o piso escorregadio e não nos atrevemos a subir ao cume do rochedo, não vá um acidente ditar o fim do passeio ainda na linha de partida. Descemos antes até à clareira deixada pela pedreira que ali funcionou até aos anos 1970, entre abrunheiros, oliveiras, arbustos de funcho e de trovisco. Aqui perto, vários trilhos pedestres abeiram-se de pequenas cascatas — as mais impressionantes, dizem-nos, ficam no rio Mourão, já em Anços — mas desta vez não temos tempo para fazer a caminhada. Diogo Batalha já nos espera na Aldeia da Mata Pequena, a meros cinco minutos de carro. Uma localidade composta por 20 casas de tipologia tipicamente saloia, a maioria reabilitada para turismo, onde hoje se pode encontrar uma “ruralidade memorizada”, descreve Mário Pereira.
Apesar de Diogo Batalha ter nascido e crescido em Lisboa, a família materna era de Mafra e, desde cedo, quis vir viver nesta zona. Queria morar numa verdadeira aldeia saloia, que ainda mantivesse a traça antiga, os velhos costumes e alguma genuinidade. “Custava-me muito assistir ao desaparecimento deste legado arquitectónico. Os pequenos núcleos urbanos tradicionais desta região começaram a desaparecer”, conta. Fez uma pesquisa com base em cartas militares do século XIX para descobrir as localidades que mantinham o traçado habitacional antigo mais ou menos intacto e encontrou a Aldeia da Mata Pequena. Estávamos em 1998, quando Diogo Batalha e Ana Partidário renovaram o primeiro edifício. Habitaram-no durante dez anos, até a família crescer e mudarem-se para uma casa maior na aldeia, “a 50 metros de distância”. O primeiro edifício foi recuperado para habitação própria, mas o “sonho do projecto turístico” já andava “oculto” no inconsciente do casal. Em 2002 compraram as primeiras seis ruínas; em 2006 chegaram os primeiros hóspedes.
“Tivemos o privilégio de ainda apanhar sete habitantes na casa dos 70 anos, que conheciam cada pedrinha e lembravam-se de ver todas as casas habitadas”, recorda Diogo. A dona Silvestre “era a alma da aldeia”. Levava os turistas pelo braço e encetava com eles longas conversas, apesar de não falar nenhuma língua estrangeira. Já o tio Eduardo tinha os pormenores “gravados na memória como fotografias” e foi ajuda fundamental para repor tudo o mais idêntico possível àquilo que fora em tempos. Aqui não é o passado que se acomoda às vicissitudes do novo destino como unidades de alojamento rural. São as camas que sobem em mezanino sobre a cozinha para não destruir o lagar, a sala que se encolhe para preservar o forno de lenha ou as cozinhas que mantêm as chaminés de trave em pedra, as salgadeiras e os potes de azeite, os móveis rústicos ou as arcas construídas em sucupira, madeira rica do Brasil, muito provavelmente aproveitando restos dos materiais utilizados no palácio de Mafra. Os lagares, o palheiro, o armazém do feno e o forno são hoje cinco das 13 suítes disponíveis, mas no velho curral ainda vive um porco grande e rosado, há coelheiras, um burro, cabras, patos, perus, gatos selvagens. E quatro casas habitadas permanentemente por 11 residentes, incluindo Diogo, Ana e os dois filhos do casal. Mais a Tasquinha do Gil, à entrada da aldeia, por agora aberta apenas sextas e sábados.