Fugas - Viagens

  • Amanda Ribeiro
  • Amanda Ribeiro
  • Amanda Ribeiro
  • Amanda Ribeiro
  • Amanda Ribeiro
  • Amanda Ribeiro
  • Amanda Ribeiro
  • Amanda Ribeiro
  • Amanda Ribeiro
  • Sossusvlei
    Sossusvlei Amanda Ribeiro
  • Yvette Naris, em Solitaire
    Yvette Naris, em Solitaire Amanda Ribeiro

Continuação: página 3 de 7

Estamos na Namíbia ou noutro mundo?

Muitos viajantes fazem-no à boleia de operadores turísticos, outros optam por alugar um carro, com ou sem guia. Percebe-se. Salvo alguns cuidados (ver caixa), é um método seguro e relativamente económico. E dá sempre oportunidade para sacar a câmara fotográfica numa ou noutra paragem inesperada. Sejam girafas a atravessar a estrada. Macacos em cima de um sinal de trânsito. Visões que, de tão perfeitas, quase parecem réplicas de postais. É o que encontramos no Noroeste do país, entre Kunene e Erongo, área que por muitos continua a ser conhecida por Damaraland. Uma inóspita paisagem rochosa que não se cansa de nos pregar partidas. Daquelas que, mais uma vez, nos fazem questionar a permanência nesta realidade. Primeiro, de levezinho: pela janela surgem grandes montanhas esverdeadas, que orgulhosamente se erguem da terra, mas cujo cume parece ter sido alvo de uma machadada horizontal — totalmente liso. Eis o bloco de Grootberg, sabemos mais tarde. O assombro não pára, porém. É em Damaraland, entre Outjo e Khorixas, que se situa Vingerklip, uma formação rochosa com milhões de anos, um acto de equilibrismo por si só. Quase parece que o monólito de 35 metros pode balançar a qualquer momento, mas não; é um dedo gigante de pedra, não cai, só mete respeito. Tal como Spitzkoppe, conhecido como o Matterhorn da Namíbia, um conjunto de majestosos picos de granito que faz as delícias de alpinistas. E não só: ao redor podem ser vistos muitos exemplos milenares de arte dos san (bosquímanos), uma das muitas etnias que existem na Namíbia e que provam a sua diversidade (mas já lá vamos). Há que ter tempo para espreitar o maciço de Brandberg, a montanha mais alta da Namíbia, cujo pico ultrapassa os 2500 metros de altitude, e que é também uma gigantesca galeria de arte rupestre a céu aberto: aqui refugia-se a famosa pintura The White Lady. Para uma imersão completa na história arqueológica é obrigatório visitar Twyfelfontein, Património Mundial da UNESCO desde 2007, que tem uma das maiores concentrações de petróglifos de todo o continente. As gravações, que remontam à Idade da Pedra e são de autoria san, estão bem preservadas e retratam animais, como rinocerontes, elefantes, avestruzes, girafas, mas também humanos a caçar. Bem perto está também a Floresta Petrificada, uma surreal visão de troncos de árvore com 280 milhões de anos que fossilizaram e ali estão, de aspecto quase intacto, quase perfeitas pedras, entre muitas Welwitschia mirabilis, planta que só existe no deserto do Namibe e que é ela própria um fóssil vivo milenar. E a poucos metros da desoladora Burnt Mountain há uma outra visão extraterrestre: elegantes e alinhados pilares de dolerito expostos pela erosão. Como se estivéssemos perante um órgão de tubos em pleno deserto; Organ Pipes, assim se chama o local. Já fomos para outra dimensão, não é?

Damaraland é também a casa dos damaras, falantes de nama, língua de uma sonoridade surpreendente, recheada de cliques. Apesar da baixa densidade populacional, a Namíbia é dona e senhora de uma diversidade étnica riquíssima. Os namibianos não são apenas namibianos. São, entre outros, ovambo (o maior grupo), são kavango, são himba, são damara, são san, são baster. São herero e são nama, grupos que foram vítimas do colonizador alemão naquele que se diz ter sido o primeiro genocídio do século XX — o caso chegou ao tribunal norte-americano há uns meses. São brancos, são negros, são mestiços, mais claros, mais escuros. A língua oficial é o inglês, mas existem 13 reconhecidas a nível nacional, entre afrikaans, alemão, oshiwambo, nama, sendo que grande parte da população fala, ou pelo menos arranha, várias. Nesta zona, como noutras, é também possível ter um vislumbre destas culturas, visitando por exemplo uma aldeia himba. Apesar de alguma modernização (as mulheres, de grandes colares no pescoço, estão nas cidades a vender artesanato, compram produtos no supermercado), a icónica tribo seminómada, que vive da pastorícia, conserva tradições como usar uma pasta avermelhada feita de gordura e ocre para cobrir o corpo seminu e os cabelos, investindo em penteados altamente característicos e magníficos. A experiência pode ser agridoce: percebe-se que a chegada de turistas não é estranha. Será que deveria ser?

--%>