Fugas - Vinhos

  • Manuel Roberto
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A genica, a força, a energia, a invenção está tudo do lado dos DOC Douro

Faz sentido, neste tempo em que o pensamento económico dominante é de cariz liberal, pedir o reforço da ingerência do Estado no Douro e no vinho do Porto?

Eu acho que sim. Uma parte da responsabilidade é dos próprios durienses. Os agricultores, pequenos, médios ou grandes, os sócios das cooperativas ou da Casa do Douro, há aqui uma massa humana que poderia e deveria estar mais empenhada, mais activa, mais consciente dos seus direitos e dos seus deveres. Uma parte da deficiência vem daí. O Douro, as suas pessoas, os seus lavradores, as suas instituições não têm sido suficientemente protagonistas dos seus próprios interesses. E muitas vezes, quando se queixam, dizem ao Estado que faça…

Estão habituados…

Estão habituados há mais de 200 anos ou 300. Quanto ao Estado, eu tendencialmente sou liberal mas não sou nada dessas coisas que andam por aí agora a ferir a nossa economia e a nossa sociedade. O Estado tem obviamente de olhar para o sector, não pode de um momento para outro desaparecer. Uma região demarcada exige regulação, exige disciplina.

Ora o Estado, as autoridades centrais, desinteressaram-se muito do Douro. As câmaras desinteressaram-se e há uma espécie de jogo de empurra: o Estado queixa-se das câmaras das cooperativas e dos lavradores; os lavradores queixam-se das cooperativas e do estado. Há uma espécie de culpa circular. Mas há circunstâncias boas: umas dezenas de médias empresas, sobretudo nos vinhos do DOC, e também de vinho do Porto, criaram o novo Douro, com pouca ajuda do estado directamente.

O PDRITM [um programa financiado pelo Banco Mundial nos anos de 1980] e os programas europeus foram muito importantes. Metade do vinhedo do Douro foi transformado desde o PDRITM, nos anos 80, com o apoio da UTAD, com a CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte), com a Universidade do Porto, num processo que teve sucesso.

Hoje, os grandes grupos, que são cinco ou seis, controlam hoje algo como 85% do comércio do vinho do Porto. Nunca houve na história uma concentração tão elevada. Eu sei que são empresas boas, que merecem confiança, que fazem óptimos vinhos, simplesmente eu não acho saudável que haja um grau de concentração elevada.

Enquanto do outro lado a fragmentação é enorme. Só há mil agricultores com mais de cinco hectares...

Há muitos que não são produtores. Têm uns jardins que fazem umas uvas. Têm de se tratados como pessoas que mantêm o equilíbrio social e ecológico. São fundamentais para o equilíbrio da região, mas não podem ser tratados como alguém que produz cinco 10 20 pipas, que é um pequeno produtor mas que já tem uma escola.

Sabemos hoje que alguns dos grupos do vinho do Porto têm mais de 2500 fornecedores. Simplesmente isto mostra que há uma fortíssima organização no comércio e uma muito reduzida capacidade de organização social da região, o que faz com que esteja a perder rendimentos, força, esteja a perder a própria palavra. Ninguém sabe o que pensam hoje os lavradores do Douro como tal. Há aqui um desequilíbrio sério, que pode ser grave um dia e ao qual convinha pôr cobro.

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