Fugas - Vinhos

  • Manuel Roberto
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A genica, a força, a energia, a invenção está tudo do lado dos DOC Douro

Mas a sua análise do Douro não segue os cânones da guerra dos mundos. Para ele o Douro é um lugar de encontro. De transmontanos e galegos com ingleses, de pequenos agricultores com capitalistas voltados para o mercado mundial, de interesses locais com os interesses do Estado.

Sem deixar de desafiar o leitor com as suas percepções e a sua interpretação da história ou do presente, António Barreto preocupa-se em explicar o que é o Douro e por que razão o Douro contemporâneo é o cúmulo de um caminho secular. Fá-lo com a sua escrita directa, acutilante e clara, com o testemunho da sua emoção, com o rigor de quem sabe que o Douro só se conhece (e ama) se for percebido como uma obra do génio humano.

“Para fazer o seu vinho, os homens do Douro lutaram contra a natureza. Com amor e ódio, como nas paixões. Fundiram-se com ela, esposaram-na, dominaram-na e por ela foram dominados. Das encostas, fizeram degraus e escadarias; da rocha, terra e jardim; do calor e da secura, vinho e açúcar. Lutaram contra a doença, a filoxera das videiras e o paludismo dos homens, como combateram contra a geada e o granizo. E lutaram finalmente entre si e contra os outros. E, como sempre na vida, lutaram especialmente contra a injustiça e o desprezo”, escreve.

Para lá da beleza e do saber do texto que por si só tornam a revisitação de Douro (que, nesta edição, conta com um capítulo integralmente novo, “20 anos depois”), o livro de António Barreto vale também como um álbum de fotografia, que resulta de um trabalho minucioso e competente de Ângela Camila Castelo-Branco. Gaspar Martins Pereira, que fez a apresentação do livro no Porto, considera que “António Barreto reúne aqui o mais fabuloso portfólio fotográfico alguma vez publicado num livro sobre o Douro. São cerca de 230 fotografias, mais de 150 da sua autoria, as outras de arquivo, algumas delas inéditas, de fotógrafos como Forrester, Emílio Biel, Domingos Alvão, Álvaro de Azevedo e outros”.

Pelas palavras ou pela imagem, Douro é uma obra indispensável para se perceber o mundo do Douro e dos seus vinhos e para entender como a produção duriense foi um tema constante na história nacional durante quase dois séculos (meados do século XVIII até por volta dos anos de 1960). Mas mesmo que fosse possível dispensar a valia da sua informação, o livro valeria por si só apenas pela maravilha da sua escrita.

Barreto é, sem dúvida, um dos melhores cultores da língua nos dias que correm. O ritmo das palavras, a cadência das frases ou a inteligência no encadeamento da narrativa proporcionam ao leitor um enorme prazer. Até por isso Douro é um dos acontecimentos do mundo editorial português dos últimos meses.

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