Fugas - Vinhos

  • Manuel Roberto
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A genica, a força, a energia, a invenção está tudo do lado dos DOC Douro

Há 20 anos atrás quando escreveu o seu livro não imaginava que os DOC Douro tivessem a importância que têm hoje.

Eu dizia nessa altura, ‘estão a surgir’, ‘começaram a surgir’. Do que falava? Do Duas Quintas e mais dois ou três. Eu estive 12 anos fora de Portugal, cheguei em 1974, e comecei a andar à procura de vinho. Tinha estado 12 anos a beber vinho francês ou italiano na Suíça. E em Portugal não havia praticamente garrafas de vinho. O branco era geralmente um desastre, mal feito, oxidado, um desastre.

E quando pedia tintos do Douro ainda me lembro do que aparecia. A frasqueira Lello, da Borges, o Granton, da Companhia, da Evel, também da Companhia, depois apareceu o Porca de Murça, que era uma ‘grande pomada’ como se costumava dizer. E no Douro não havia mais nada. Havia o Barca Velha, que era intocável, mas nessa altura só tinha havido quatro ou cinco colheitas. Todos os nomes de vinho que agora se fala têm menos de 20 anos. O Vale Meão, o Redoma, o Vallado tudo isso tem 15 anos, 10 anos.

Houve uma alteração enorme, enorme. Quase toda esta gente ou tem filhos que fizeram enologia em Vila Real, ou foram estudar agronomia com o Magalhães [Nuno Magalhães, professor e investigador da UTAD], ou alugam serviços de enólogos, até estrangeiros vêm - a Casa Amarela tem um francês, há a fantástica espanhola, a Susana Esteban... Toda esta gente agora tem enólogos e engenheiros de viticultura e sem isto não tinha havido esta mudança.

Essa capacidade de importar talento está mais associada ao DOC Douro do que do vinho do Porto?

A genica toda está do lado do DOC Douro. A genica, a força, a energia, a invenção, o esforço comercial está tudo do lado do DOC Douro. Em muitos casos o litro de DOC bom pode ser superior ao litro do Porto.

A prazo isso pode ter consequências negativas. O DOC Douro tem toda a genica, mas o Porto ainda representa 75% das receitas da região.

Eu não quero enfraquecer o vinho do Porto. Quero fortalecer o DOC. Se para fortalecer o DOC eu enfraqueço o Porto, por uma razão qualquer, estou a estragar tudo. Se o vinho do Porto tem solidez é uma solidez discutível, porque a concentração empresarial económica e financeira do vinho do Porto é excessiva e a falta de protagonismo dos produtores é excessiva também. Mas não quero correr o risco de enfraquecer o vinho do Porto para poder enriquecer o DOC. Agora tenho na minha cabeça, primeiro, que o Porto já teve uma ou duas crises gravíssimas ao longo destes 100 ou 200 anos e não pode ter mais – bom, Portugal também tem tido sucessivamente uma crise.

O seu livro é mais do que uma reedição. Há muitas coisas novas e diferentes.

Nos primeiros capítulos houve apenas uns retoques. Eu tentei ser honesto dizendo que este livro é o mesmo mas que este livro não é o mesmo.

O Douro mudou muito. E a sua visão sobre o Douro mudou em quê? Teve alguma revelação nestes 20 anos?

Houve algumas boas, outras más. Quanto às más, há 20 anos eu julgava que havia mais força no Douro. Ainda hoje vai ler a literatura local, os jornais locais e sente-se que o duriense está sempre a ferver, o duriense está sempre a queixar-se. E sente-se que havia ali qualquer coisa.

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