Fugas - Viagens

  • Barcelona com vista Gaudí
    Barcelona com vista Gaudí Rui Gaudêncio
  • O Arco do Triunfo
    O Arco do Triunfo Rui Gaudêncio
  • Gustau Nacarino/Reuters
  • O Hospital de Sant Pau, o maior recinto modernista do mundo
    O Hospital de Sant Pau, o maior recinto modernista do mundo Robert Ramos/Fundación Privada Hospital de Sant Pau
  • Os sinais modernistas de Barcelona são um dos seus maiores cartões de visita
    Os sinais modernistas de Barcelona são um dos seus maiores cartões de visita Adriano Miranda
  • Agora há um grandee mural-beijo para celebrar a liberdade. E destinado a muitas fotos dos turistas
    Agora há um grandee mural-beijo para celebrar a liberdade. E destinado a muitas fotos dos turistas DR
  • Por mais voltas que se dêem, as Ramblas serão sempre passagem obrigatória na cidade
    Por mais voltas que se dêem, as Ramblas serão sempre passagem obrigatória na cidade Rui Gaudêncio
  • Paseig de Gràcia
    Paseig de Gràcia Rui Gaudêncio
  • Uma das paragens obrigatórias dos turistas: o mui concorrido mercado La Boquería
    Uma das paragens obrigatórias dos turistas: o mui concorrido mercado La Boquería Rui Gaudêncio
  • O Born (à esquerda) tornouse um dos bairros da moda há poucos anos. O mercado renovado vai ser um grande centro cultural e de animação
    O Born (à esquerda) tornouse um dos bairros da moda há poucos anos. O mercado renovado vai ser um grande centro cultural e de animação Rui Gaudêncio
  • A bandeira catalã impõe-se por todo o lado
    A bandeira catalã impõe-se por todo o lado Rui Gaudêncio

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Em Barcelona, a liberdade anda nas bocas do mundo

Jordi Ferran, nascido num bairro do Eixample e a viver agora em Poble Nou, perto da praia, confessa que já está habituado. “É assim desde os jogos olímpicos [1992]”, diz o barcelonês de 43 anos numa sexta-feira à noite enquanto ziguezagueamos pelas Ramblas, o caminho mais curto para chegar ao estacionamento, nem por isso o mais rápido. Não se aborrece tanto com as multidões como com a uniformização de tudo — os exemplos estão por todo o lado, diz, apontando para o comércio, quase todo, seja de restauração ou de vestuário, grandes cadeias internacionais, mas onde sobrevive, por exemplo, a Casa Beethoven, madeira do chão ao tecto, instrumentos, partituras e tudo o que a torna referência para musicólogos desde 1880. “E já não aguento ver toda a gente vestida com Desigual”, desabafa. Na verdade, o que começou como uma marca alternativa nascida na cidade tornou-se num negócio global; contudo, nunca se verá tanta concentração de gente vestindo a marca, distintiva pelos seus padrões rebuscados e caldeirão de cores, como por estas ruas.

A Desigual tornou-se igual a tudo, portanto; no entanto, a criação de moda em Barcelona está de boa saúde e recomenda-se. Encontra-se em pequenas boutiques do Gótico, sobretudo do Born e do Raval e até nas ruas: nestas últimas, nos mercados de fim-de-semana, é óbvia a assinatura barcelonesa, com roupas de corte dissemelhante e cores fortes, talvez influências do modernismo; nas primeiras, o eclectismo é maior, e desde o minimalismo ao retro, passando por um certo glamour, há peças únicas para todos os gostos.

Único é também o Raval, um bairro que, graças à sua proximidade com o porto, passou de bairro industrial e de operários em que se tinha transformado no século XIX a bairro de imigrantes. Chegou a ser conhecido como o “bairro chinês” de Barcelona mas agora já não são os chineses que dominam a sua paisagem; por estes dias, a comunidade de paquistaneses e indianos é maioritária. A maior mas não a única, neste bairro que é um dos mais multiculturais de Barcelona mas nunca perdeu o seu carácter proletário mais marcado. E se as paragens históricas do Tricentenário cabem quase todas do lado direito das Ramblas — a única excepção no Raval é o antigo Hospital de Santa Creu, que recebeu os feridos do conflito e agora é Biblioteca da Catalunha – as paragens artísticas, BCN RE.SET, com prazo de validade, é certo, espalham-se muito pelo Raval.

Na verdade, no Raval cabe toda a Barcelona. Embora em onda. Junto das Ramblas, o Raval pouco se distingue do bairro Gótico, com os seus cafés, restaurantes, hotéis, lojas alternativas e até algumas de recuerdos; o Palácio Güell, uma das obras mais emblemáticas de Gaudí, também se encontra nesta zona. Aproximamo-nos na Rambla do Raval, com o famoso Gato de Botero, a escultura em bronze de um avantajado e redondo felino que é a mascote do bairro, para mergulhar mais profundamente nesse Raval de imigrantes. Nas ruas, sucedem-se locutórios, lojas de produtos electrónicos e pequenas mercearias (aliás, por toda a cidade os pequenos supermercados abertos 24 horas durante o fim-de-semana são propriedade de paquistaneses), sempre com a companhia de bares, restaurantes e crianças em brincadeiras. Esta encruzilhada é plasmada numa das instalações do BCN RE.SET com que nos deparamos inesperadamente. Na enorme esplanada de cimento que dá passagem entre o Museu de Arte Contemporânea (MACBA) e a lateral do convento gótico dels Angels (actualmente o Foment de les Arts i del Disseny), habituados que estamos às tangentes dos skateboarders que ali têm a sua pista e a sentarmo-nos nos degraus do museu vendo as manobras, não contávamos encontrar um estendal altíssimo de onde pendem t-shirts negras com rostos anónimos — passado e presente na Diversidad (Studio Odeile Dcq), de gentes que já viveram por aqui, e de tradições que ainda perduram (a roupa a secar, saindo das janelas e de pequenas varandas de ferro, é uma constante).

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